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PROSTITUIÇÃO
Com dificuldades para pagar escola, universitárias se prostituem e usam currículo como chamariz
Nível superior vira qualificação no mundo das garotas de programa
GILBERTO DIMENSTEIN
do Conselho Editorial
Desde a infância ela cultivava o
sonho de virar atriz.
Concluído o segundo grau no interior de Minas, veio para São Paulo e se inscreveu num curso de artes cênicas -não imaginou que teria de desempenhar o papel de
prostituta, inventando nomes e
fantasias para ganhar dinheiro.
Com 20 anos, viu-se há seis meses sem condições de pagar a escola de teatro Célia Helena e manter
seu sustento.
Uma amiga apresentou-lhe o caminho mais rápido para resolver
os problemas, introduzindo-a na
rota sofisticada da prostituição
paulistana.
Trabalhando apenas à tarde, ela
consegue fazer R$ 4.000 por mês,
em média. "É por pouco tempo, logo saio disso", diz Roseana, nome
fictício -como os outros nomes
de mulheres desta reportagem.
Seu maior pavor é que alguém a
reconheça, espalhando entre os
colegas de curso sua vida dupla.
A vida dupla de Roseana não é
raridade. O mercado do sexo está
aberto para jovens de maior padrão cultural, o que significa nível
de ensino superior -um mercado
favorecido pelo empobrecimento
da classe média, popularização do
ensino superior e, mais importante, ausência de crédito educativo
para quem paga mensalidades.
"A falta de crédito educativo provoca mesmo tragédias", afirma o
ministro da Educação, Paulo Renato Souza (leia texto nesta página), prometendo ajudar os alunos
de escolas privadas.
"Menina de programa universitária tem alto valor", afirma Oscar
Marone, há 20 anos "na noite" e
um dos maiores especialistas na
prostituição chique paulistana.
Ele é dono do bar e boate Bahamas, em Moema, frequentado todos os dias por pelo menos 150 jovens -ao lado do Café Photo, no
Itaim, e Kilt, região central, o Bahamas é das passagens obrigatórias das prostitutas universitárias.
"As histórias são parecidas. Não
conseguem pagar a mensalidade e
manter o padrão social de seus colegas. Descobrem que, fazendo
programas, podem ganhar em
apenas um dia a mensalidade",
afirma Oscar.
"Fica sentado aí e você vai ver as
meninas chegando com livro debaixo do braço", diz Lilian, que
frequenta o Bahamas.
Ela tem diploma superior, obtido
em Salvador, onde cursou contabilidade. "Saber se comunicar ajuda,
já que parte do nosso negócio é ficar conversando."
Frequentadora do Café Photo e
Bahamas, Alessandra, vinda do interior de Santa Catarina, que cursa
administração na UniBan, resume:
"Se eu trabalhasse num shopping
ganharia por mês R$ 500. Não paga
minha mensalidade".
Loira, com um rosto de modelo
profissional, vestido preto justíssimo no corpo, ela diz que, em média, ganha R$ 8.000 mensais; seu
hobby é pintura abstrata.
Por que estuda? "Sei que esse rostinho bonito e o corpo em cima
acabam logo. Preciso ter alguma
coisa a mais na cabeça para viver."
O título de universitária é encontrado com frequência nos classificados de jornais, sites na internet
destinados à venda de sexo, agências que oferecem acompanhantes,
saunas e casas de massagem.
Apenas numa sauna chamada
Emanoelle, na rua Augusta, há
quatro estudantes universitárias.
"É um bico horrível, mas é o que
posso fazer", afirma uma delas,
que cursa Direito na FMU.
"O problema é que, muitas vezes,
o bico vira emprego definitivo, elas
acabam gostando do luxo", comenta Oscar.
Marina estudava na Faap, trancou a matrícula e, agora, prepara-se para voltar.
Conseguiu, até agora, manter segredo sobre suas atividades -assim como mantém segredo sobre
demais colegas que faziam programa na faculdade.
"Venho de uma família do Paraná em que todos os meus irmãos
puderam estudar na faculdade.
Logo que puder, junto mais dinheiro e abro um negócio", comenta Marina, hoje sem marido e
com um filho para sustentar.
As dificuldades econômicas vieram depois que o marido a abandonou com o filho e não tinha para
quem pedir ajuda. "Sei que, sem
diploma superior, é difícil se dar
bem", comenta Marina, que se dispôs a posar na frente da Faap, com
a roupa que usa para seduzir clientes durante a tarde.
Filha de japoneses, Joana tem a
mesma trajetória de Marina. Sem
condição de pagar o curso de turismo, começou a se prostituir.
Logo percebeu que, além do corpo bonito, falar inglês e espanhol a
ajudava a atrair clientes estrangeiros. "É muito grande o número de
executivos estrangeiros", comenta, deixando-se fotografar de costas na piscina de uma sauna.
"Duro vai ser ganhar a mesma
coisa. Mas meu sonho é trabalhar
com turismo", garante.
Elas sentem vergonha de sua atividade clandestina -mas ao mesmo tempo se sentem atraídas pela
facilidade financeira.
O sonho delas não é voltado apenas a ter uma família, mas à realização profissional.
Roberta estudava enfermagem
em Goiânia. "Entrei na enfermagem porque queria trabalhar com
crianças deficientes", lembra.
O Café Photo a introduziu na rota chique, na qual faz mais dinheiro do que imaginou que faria
-mas também passou perigos,
quando um cliente que, revólver
em punho, quis matá-la. Naquele
dia, ela estava acompanhada de
Alessandra.
As duas correram, trancaram-se
no banheiro do quarto de hotel;
Roberta deu um tiro para advertir
o agressor de que estava armada. O
homem, com medo de que ouvissem os tiros, fugiu.
"Estou dando um tempo, mas
quando puder vou voltar à enfermagem e cuidar de crianças", diz,
decidida, por enquanto, a manter
o revólver sempre na bolsa.
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