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SAÚDE
Auditoria aponta descontrole na
rede pública e reprova 23 Estados
Técnico aponta internações "fantasmas", superfaturamento, serviços desnecessários e desvio de materiais
MARIO VITOR SANTOS
enviado especial a Brasília
Uma auditoria dos procedimentos administrativos do SUS (Sistema Único de Saúde) feita pelo Ministério da Saúde chegou a uma
conclusão que impressiona pela
objetividade. De acordo com o documento "Ações Desenvolvidas -
1997", a partir do exame de 68
quesitos diversos, existe "um total descontrole dos serviços prestados pela rede pública de saúde".
Das 27 unidades da Federação
avaliadas quanto à gestão da assistência hospitalar e ambulatorial ao
final de 1997, 24 receberam nota
inferior à média (8,0). Apenas 3
secretarias estaduais de Saúde foram consideradas aprovadas: Paraná, Minas Gerais e Mato Grosso.
O estudo levou em conta vários
itens. Por exemplo, se as secretarias efetuam a programação de
gastos apenas com base na produção de anos anteriores, sem levar
em conta as necessidades atuais da
população, ou se a autorização de
internação emergencial é feita em
um prazo de 72 horas.
O Estado com a pior colocação
foi Roraima, com 2,5 de média. O
mais bem colocado foi o Paraná,
com 8,4. São Paulo obteve 4,9,
abaixo de Minas (aprovado com
8,1) e do Rio (reprovado, com
6,2). O outro Estado aprovado foi
Mato Grosso, com 8,1. No ano
passado, Maranhão e Amapá chegaram a sofrer uma espécie de intervenção do ministério, tal era a
desorganização de seus sistemas.
O diretor-geral do Datasus, a
empresa que processa os dados do
SUS, Jorge Bandarra, contesta o
quadro descrito pela auditoria.
"Realizamos em média 1,1 milhão de internações por mês. É óbvio que existem fraudes e descontrole, mas o índice é baixo, menor
do que em qualquer outra área do
governo. Em 1 milhão de procedimentos, encontramos no máximo
10 anormalidades, índice que
ocorre em qualquer estrutura."
Para Gilson Carvalho, secretário
de Assistência à Saúde no governo
Itamar Franco (92-94), as autoridades ainda hoje não têm controle
sobre as perdas advindas de fraudes ou de desvios diversos.
Fraudes
Entre eles, Carvalho cita as guias
de internação "fantasmas", o superfaturamento de serviços, a encomenda de exames e a prescrição
de medicamentos desnecessários,
os desvios de próteses, o uso de
serviços do SUS por clientes de
planos privados de saúde e a cobrança de serviços "por fora":
"Não conheço nenhum estudo
que as tenha quantificado, mas sabe-se que essas perdas existem".
Qualquer avaliação da saúde,
contudo, deve levar em consideração que o país passa por um processo de descentralização e municipalização dos serviços, deflagrado pela Constituição de 1988.
Antes da municipalização, o sistema era gerido unicamente por
Brasília. O ministério recebia relatórios de 1,5 bilhão de procedimentos ambulatoriais, processava
a papelada e realizava o pagamento, sem condições de detectar
fraudes, salvo por amostragem.
Até agora, a descentralização
vem se concentrando no chamado
Piso de Atenção Básica, pelo qual
se destinam diretamente aos municípios habilitados cerca de R$ 10
anuais por habitante para a realização de procedimentos como
consultas e exames simples.
Mais de 4.000 municípios estão
habilitados a gerenciar parte dos
serviços, recebendo repasses que
totalizam R$ 2,3 bilhões (apenas
12% do Orçamento da Saúde).
A descentralização interrompeu
o pagamento por serviços feitos,
grande fonte de fraudes, embora
ainda mantenha no antigo sistema
as verbas mais relevantes (as de internações e procedimentos complexos). Só 150 municípios foram
autorizados a fazer a gestão plena,
em que as prefeituras se responsabilizam também pelas internações
e procedimentos mais complexos.
Controle municipal
O recém-empossado secretário
de Assistência à Saúde do ministério, Renilson Rehem de Souza, defende a tese de que a municipalização implica controle social do dinheiro gasto e mais eficiência do
sistema como um todo.
Mas o ministério não dispõe de
dados comparativos entre a gestão
municipalizada e a anterior para
comprovar essa tese: "Na maioria
dos municípios, a gestão vai melhorar", afirma Souza.
Seu colega Bandarra, da direção
do SUS, declara que quando a gestão é passada aos municípios,
mesmo os pequenos indícios de
irregularidades desaparecem.
Mas, se há algo em que o ministério mostra avanço, é na transparência. As páginas do Datasus na
Internet mostram dados sobre internações, procedimentos realizados e pagamentos feitos em todo o
país. Permitem cortes por procedimentos médicos e localidade.
"Nós só conseguimos ter melhor controle de determinadas
áreas a partir do final do ano passado", informa o secretário-executivo do ministério, Barjas Negri.
Até então, diz ele, mesmo casas de
saúde fechadas podiam continuar
apresentando suas faturas ao governo por serviços que nunca
prestaram. E o governo pagava.
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