São Paulo, segunda, 25 de maio de 1998

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Exame inútil eleva custo nos hospitais

da Reportagem Local

"O desperdício nos hospitais é grande, e a principal fonte de desperdício está ligada à corporação médica e a um sistema que acaba estimulando o acúmulo de procedimentos com um paciente, o que encarece o atendimento e, em alguns casos, aumenta a remuneração do médico."
A afirmação é do administrador da Santa Casa de Leme (190 km a noroeste de SP), Paulo Cesar Amadeu, para quem está na hora de descobrir fórmulas capazes de reduzir o corporativismo dos médicos ou que ele seja usado em benefício de uma melhor utilização dos recursos da saúde.
"O instrumento mais caro do hospital é a caneta do médico", costuma dizer o doutor José Roberto Ferraro, diretor do Hospital São Paulo, que atende 4.500 pacientes do SUS todos os dias. Entre 60% e 80% dos exames requisitados dão resultado negativo, de acordo com vários levantamentos, o que indica que existe um excesso de requisições desse tipo, sem a necessária base médica.
Tanto a Santa Casa de Leme como o Hospital São Paulo (que pertence à Universidade Federal de São Paulo) enfrentam graves dificuldades financeiras, com prejuízos à qualidade dos serviços.

Reengenharia

Mas há experiências felizes, como a da Santa Casa de Limeira, que está no 3º ano de uma reengenharia hospitalar iniciada a partir da decisão de duas indústrias ali instaladas: a Varga e a Rockwell Fumagali.
Acostumadas à cultura da qualidade total, as duas empresas decidiram liderar uma grande coalizão social na cidade para interromper a derrocada da Santa Casa.
Gilberto Scarazati, 43, médico-administrador, conselheiro do CRM, foi contratado. Ele realizou uma auditoria e traçou um plano estratégico de cinco anos para reerguer o hospital.
A auditoria constatou um quadro comum a pelo menos 300 das 412 Santas Casas existentes no Estado. As diversas áreas do hospital estavam dominadas por famílias: só eram contratados membros desses clãs, geralmente mal pagos e sem qualificação.
O hospital tinha 350 leitos em que os pacientes eram abrigados sem meios de assistência tão simples quanto um ressuscitador. Mesmo assim, a dívida chegava a R$ 1 milhão, o dobro da renda mensal.
A espinha dorsal do plano de investimentos foi estabelecer parcerias estratégicas com os maiores clientes do hospital, o SUS e os planos de saúde.
Para dar o primeiro passo, eram necessários R$ 300 mil para refazer a unidade de emergência -que estava em situação pior do que a dos doentes que recebia. O Estado entrou com R$ 200 mil, a Unimed local, com R$ 40 mil. As prefeituras vizinhas com o resto.
Acertos semelhantes serviram para renovar e ampliar o centro cirúrgico, a UTI e o centro obstétrico. Agora falta a conclusão de outro centro obstétrico, de unidades de apoio técnico (como laboratórios de análises clínicas) e a montagem de unidades especializadas em procedimentos de alta complexidade e alto custo.
O hospital, que antes do plano tinha 80% de funcionários leigos, hoje tem 73% de profissionais formados. A relação com os médicos foi alterada, todos foram contratados, direitos foram concedidos, e as obrigações, cobradas. As prescrições médicas passaram a ser regulamentadas e auditadas.
Em 95, antes do plano, o gasto com medicamento e material era de R$ 240 mil mensais. Hoje, é de R$ 177 mil, embora o número de atendimentos tenha crescido, assim como sua complexidade: só a UTI passou de 6 para 32 leitos.
O resultado do trabalho na Santa Casa, que atende 73% dos seus clientes pelo SUS, já pode ser medido pelos índices. A mortalidade infantil caiu em Limeira de 21 mortes por 1.000 nascidos vivos para 17 por 1.000. O diretor acha que 75% da queda resulta das inovações introduzidas na gestão do seu hospital. (MVS)



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