São Paulo, segunda-feira, 25 de junho de 2001

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Catador abandonou botijão para cozinhar

DA REPORTAGEM LOCAL

Todo o lixo da casa do pernambucano Jocemar Silveira, 29, é atualmente reaproveitado. Os materiais inorgânicos vão para a reciclagem; os orgânicos são usados para produzir gás de cozinha.
A comida preparada com o metano que vem da degradação do lixo tem um sabor especial. Catador em São Paulo há mais de dez anos, Silveira, que só estudou até a oitava série do ensino fundamental, construiu sozinho o biodigestor que transforma restos de comida em combustível.
O protótipo, em funcionamento desde abril, abastece as seis pessoas da família de Silveira e é um exemplo do autodidatismo e da experiência prática do catador.
"Pela observação do lixo, percebi que os sacos onde ficavam guardados os resíduos orgânicos, depois de um certo tempo, inchavam e ficavam suados, molhados do lado de fora", conta Silveira.
Estudando por conta própria o fenômeno, ele chegou à conclusão de que o "inchaço" era causado pelo gás metano que emana no processo de degradação orgânica e que poderia ser reaproveitado.
"Nós [da Associação de Catadores do Núcleo Habitacional Pedra Sobre Pedra, na zona sul de São Paulo, presidida por Silveira" pensávamos em dar outra destinação para o material orgânico, além da compostagem", diz. "O metano é um combustível alternativo, já que o gás de cozinha tradicional [mistura de butano e propano" é derivado do petróleo, um recurso não-renovável."
O protótipo custou R$ 200, segundo Silveira. O cilindro de 1 m de comprimento e 30 cm de diâmetro onde ficam os restos e o metano foram encontrados no lixo; os mecanismos de controle de pressão e as válvulas reguladoras custaram, ao todo, R$ 180; e a execução do projeto consumiu R$ 20.
O biodigestor levou seis meses para ser concluído. "Já estou economizando até R$ 38 por mês por não ter de comprar dois botijões de gás de cozinha", diz. Os dois primeiros meses de teste revelaram que 25 quilos de alimento, armazenados por 72 horas no cilindro, produzem 13 quilos de metano -quase um botijão.
"Agora eu preciso de ajuda de universidades, iniciativa privada e poder público para continuar os estudos e produzir em larga escala. Mas, se não conseguir, vou começar sozinho mesmo. Sou um homem prático", afirma Silveira.
A utilização do metano na cozinha ainda é considerada restrita em razão da necessidade de uma pressão muito alta para liquefazer o gás, de forma que ele se torne mais seguro para o uso doméstico. No estado gasoso, os riscos de explosão são muito maiores em razão da volatilidade. (MV)



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