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WALTER CENEVIVA
Mais sal na discussão do pré-sal
O caminho para influir nos destinos de nação passa pelos políticos, mas eles não podem ser os únicos a intervir
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SE O PRÉ-SAL der o resultado que
o governo divulga, será aplicável o artigo 20, parágrafo 1º da
Constituição: assegura aos Estados,
ao Distrito Federal e aos Municípios
(a órgãos da administração direta da
União) participação no resultado da
exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para energia elétrica, entre outros, no respectivo território, plataforma continental ou zona econômica exclusiva.
O cerne da questão está em saber
como será feita a distribuição. Tem
havido boa informação tecnocrática
a respeito, mas ainda não se falou na
distribuição.
Os benefícios mais conhecidos são
dos municípios litorâneos baianos e
fluminenses, graças ao petróleo extraído em sua região costeira.
A relação entre o artigo 20 e a plataforma continental (onde está o
pré-sal) sofrerá com a tripartição
dos poderes ao chegar a hora de o
Executivo, o Judiciário e o Legislativo exercerem suas competências.
Na prática, o processo decisório se
concentrará no Executivo, enquanto tocador de obras. O Legislativo sacrifica a independência e se vincula
ao Executivo. A interferência do Judiciário depende de requerimento
dos interessados e se submete ao demorado andamento dos processos.
O Executivo é o poder que pode e
usa esse poder, até sacrificando o interesse geral e heterogêneo da cidadania, submetido aos seus desígnios.
A Ajuris (Associação dos Juízes do
Rio Grande do Sul) saiu à frente, em
carta ao presidente da República, ao
dizer que o fazia "para reivindicar
mudanças profundas nos métodos
de abordagem do problema.
O pré-sal é importante demais para ser objeto de tratamento tecnocrático; é importante o suficiente
para mobilizar a sociedade civil e
ativar o sentimento nacional de urgência e participação".
Mais à frente, os magistrados sul-rio-grandenses aditam: "Sem que se
reconheça a dimensão eminentemente política e pública da matéria,
e sem que se mapeiem, com precisão
e lucidez...", faltarão às decisões legitimidade e compromisso com os interesses nacionais.
O núcleo da sociedade civil, composto pelas pessoas que afinal criam
as riquezas não meramente extrativas da nação, deve ser chamado a se
manifestar. A sociedade civil é, porém, um mundo indefinido, sem forma nem efeito de direito. Invoca a
lei, por exemplo, para sustentar suas
críticas aos sem-terra e sem-teto,
mas nem de longe mostra a mesma
determinação desses grupos em
seus objetivos.
A sociedade civil -a grande massa
indefinível do povo- não tem, e até
parece não querer ter, canais harmônicos, consistentes, constantes
de manifestação eficaz, apta a recolher sua interferência plural dos
seus muitos interesses contraditórios. Nesse quadro, e voltando aos
recursos vindos do pré-sal, outras
vozes devem surgir antes que técnicos e políticos fechem seus ouvidos
para recolher o pensamento povo.
O caminho para influir nos destinos da nação passa pelos políticos
profissionais, mas eles não podem
ser os únicos a intervir.
Precisamos de um novo artigo 20
na Constituição para tornar operativa a força da comunidade, apta a estimular o amálgama individualizado
das diferentes tendências e dos grupos de manifestação.
Talvez a internet seja útil para recriar, em versão eletrônica, a Ágora
ateniense. Colocará sal na discussão,
até aqui insossa.
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