São Paulo, sábado, 25 de julho de 2009

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WALTER CENEVIVA

Mais sal na discussão do pré-sal


O caminho para influir nos destinos de nação passa pelos políticos, mas eles não podem ser os únicos a intervir

SE O PRÉ-SAL der o resultado que o governo divulga, será aplicável o artigo 20, parágrafo 1º da Constituição: assegura aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (a órgãos da administração direta da União) participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para energia elétrica, entre outros, no respectivo território, plataforma continental ou zona econômica exclusiva.
O cerne da questão está em saber como será feita a distribuição. Tem havido boa informação tecnocrática a respeito, mas ainda não se falou na distribuição.
Os benefícios mais conhecidos são dos municípios litorâneos baianos e fluminenses, graças ao petróleo extraído em sua região costeira.
A relação entre o artigo 20 e a plataforma continental (onde está o pré-sal) sofrerá com a tripartição dos poderes ao chegar a hora de o Executivo, o Judiciário e o Legislativo exercerem suas competências.
Na prática, o processo decisório se concentrará no Executivo, enquanto tocador de obras. O Legislativo sacrifica a independência e se vincula ao Executivo. A interferência do Judiciário depende de requerimento dos interessados e se submete ao demorado andamento dos processos. O Executivo é o poder que pode e usa esse poder, até sacrificando o interesse geral e heterogêneo da cidadania, submetido aos seus desígnios.
A Ajuris (Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul) saiu à frente, em carta ao presidente da República, ao dizer que o fazia "para reivindicar mudanças profundas nos métodos de abordagem do problema.
O pré-sal é importante demais para ser objeto de tratamento tecnocrático; é importante o suficiente para mobilizar a sociedade civil e ativar o sentimento nacional de urgência e participação".
Mais à frente, os magistrados sul-rio-grandenses aditam: "Sem que se reconheça a dimensão eminentemente política e pública da matéria, e sem que se mapeiem, com precisão e lucidez...", faltarão às decisões legitimidade e compromisso com os interesses nacionais.
O núcleo da sociedade civil, composto pelas pessoas que afinal criam as riquezas não meramente extrativas da nação, deve ser chamado a se manifestar. A sociedade civil é, porém, um mundo indefinido, sem forma nem efeito de direito. Invoca a lei, por exemplo, para sustentar suas críticas aos sem-terra e sem-teto, mas nem de longe mostra a mesma determinação desses grupos em seus objetivos.
A sociedade civil -a grande massa indefinível do povo- não tem, e até parece não querer ter, canais harmônicos, consistentes, constantes de manifestação eficaz, apta a recolher sua interferência plural dos seus muitos interesses contraditórios. Nesse quadro, e voltando aos recursos vindos do pré-sal, outras vozes devem surgir antes que técnicos e políticos fechem seus ouvidos para recolher o pensamento povo.
O caminho para influir nos destinos da nação passa pelos políticos profissionais, mas eles não podem ser os únicos a intervir.
Precisamos de um novo artigo 20 na Constituição para tornar operativa a força da comunidade, apta a estimular o amálgama individualizado das diferentes tendências e dos grupos de manifestação.
Talvez a internet seja útil para recriar, em versão eletrônica, a Ágora ateniense. Colocará sal na discussão, até aqui insossa.


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