São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 2006

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Lei extingue prisão para usuário de droga

Medida foi sancionada anteontem pelo presidente e entrará em vigor em 44 dias; punição será com penas alternativas

Para grandes traficantes, a pena mínima sobe de três para cinco anos; texto também cria a figura do "capitalista do tráfico"


ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na noite de anteontem, a lei que permite aos usuários de droga cumprirem penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade, entra em vigor dentro de 44 dias.
Embora o porte de droga continue caracterizado como crime, a lei 11.343, publicada ontem no "Diário Oficial" da União, prevê que os usuários e dependentes não estão mais sujeitos à prisão. Caberá aos juizados especiais definirem medidas socioeducativas.
A lei também instituiu o Sistema Nacional de Polícias Públicas sobre Drogas, voltado para ações de prevenção ao uso, atenção e reinserção social do usuário e dependente. Prevê inclusive a possibilidade de concessão de benefícios fiscais para iniciativas nesse sentido.
O texto separa de vez o usuário do traficante, fronteira muitas vezes nebulosa nas duas leis que tratavam do tema e que foram agora revogadas. O usuário terá atendimento na rede pública de saúde, que deverá estabelecer programas específicos, com garantia de tratamento individualizado.
A lei diferencia o grande do pequeno traficante. Este último, se não tiver ligações com organizações criminosas e gozar de bons antecedentes, pode ter a pena reduzida em até dois terços. Quanto aos traficantes, que continuam julgados pelas varas criminais comuns, sua pena mínima foi aumentada de três para cinco anos. A máxima permaneceu em 15 anos.
Criou-se também a figura do capitalista do tráfico, o personagem que obtém lucro ao financiar a produção, o comércio e a distribuição de drogas. Para ele, a pena vai de 8 a 20 anos.
Com a nova lei, ampliar os serviços públicos para usuários de álcool e drogas será um dos grandes desafios dos governos estaduais, municipais e federal. Essa é a opinião do coordenador da área de saúde mental do Ministério da Saúde, Pedro Gabriel Delgado. Segundo ele, um dos problemas atuais é a falta de profissionais específicos, principalmente psiquiatras.
Até o final do ano, o governo federal pretende implantar 140 CAPs-AD (Centros de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas), que funcionam como uma coordenação para o serviço em determinada região. Haverá a necessidade de, pelo menos, mais 600 profissionais de nível superior. Atualmente existem 115 CAPs-AD de um total de 852 centros de atenção no país.
Para este ano, o governo federal planeja gastar cerca de R$ 140 milhões com a manutenção de CAPs, além de R$ 25 milhões para novas unidades.
Especialistas
A nova lei sobre drogas ainda não retirou do usuário o rótulo de criminoso, apesar de formalizar a pena alternativa para quem consome entorpecentes.
A crítica foi feita por especialistas ouvidos pela Folha. Para o juiz criminal aposentado Walter Maierovitch, "parece um erro se pensar que essa lei deixou de criminalizar o porte de drogas para uso próprio. Infelizmente não se chegou a isso".
Na opinião do presidente da Acrimesp (Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo), Ademar Gomes, o usuário é uma vítima do tráfico de drogas e não pode ser tratado como criminoso. Ele demonstrou preocupação com o fato de a nova lei não especificar a quantidade de drogas que diferencia o porte entre usuário e traficante.
Para o delegado da Divisão de Prevenção do Denarc (Departamento de Narcóticos), Edemur Luchiari, o problema mais sério é que o policial que faz a primeira abordagem precisa saber como enquadrar o usuário ou traficante.
Segundo os especialistas a lei é retroativa, mas não deve beneficiar muitos presos, porque raramente um usuário de drogas cumpre pena.


Com a colaboração de LUCIANA CONSTANTINO, da Sucursal de Brasília, e REGIANE SOARES

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