São Paulo, quarta-feira, 25 de outubro de 2000

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VIOLÊNCIA
Universidade diz que não quer compactuar com violação de direitos
PUC interrompe estágios na Febem

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

A Faculdade de Psicologia PUC de São Paulo (Pontifícia Universidade Católica), por meio do Departamento de Psicologia Social, interrompeu o programa que mantinha estagiários na Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor).
Em documento assinado pelo reitor, Antônio Carlos Caruso Ronca, a diretora da faculdade, Ana Bock, alega que a permanência dos estudantes nas unidades seria uma forma de compactuar com violações aos direitos humanos cometidas contra os adolescentes infratores.
Esse relatório foi enviado ao Procurador Geral de Justiça, Geraldo Brito Filomeno, no dia 11.
"Nossos alunos acompanharam situações de humilhação, de violência e de descuido", diz o relatório. Segundo o documento, isso é o cotidiano da Febem.
Esse rompimento ocorre no momento em que a Febem está oficialmente trabalhando para implantar uma forma individualizada de atender aos infratores, chamada de Novo Olhar.
Esse novo projeto foi iniciado após a rebelião ocorrida entre os dias 24 e 25 de outubro de 1999 no Complexo Imigrantes.
Além disso, enquanto a Faculdade de Psicologia rompeu o estágio com a Febem, o Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre a Criança e o Adolescente da PUC assinou um contrato de R$ 2,2 milhões para criar um programa para infratores em meio aberto.
O estágio começou em março e deveria terminar em novembro, mas foi interrompido em agosto.
A principal tarefa dos estudantes foi a criação de um programa de intervenção que auxiliasse os adolescentes a refletir sobre a prática de crimes.
O problema é que desde o início os estagiários perceberam que o cadeião não era um lugar adequado para a realização de programas educativos.
Os estagiários constataram que os agentes de educação eram ridicularizados pelos monitores antigos. Os relatos dos alunos em relação a esses funcionários são textuais: "A gente não humilha (os adolescentes), não bate na cara, não bate na bunda, quando eles caem, não pisa".
Um monitor de Pinheiros chegou a bater na cara de um adolescente, para mostrar a uma das estagiárias "quem mandava".
Em meados de junho, os estagiários acompanharam a transferência dos adolescentes para Franco da Rocha. Quando viram um "corredor polonês" para recepcionar os garotos, ligaram para a PUC, fazendo a denúncia.
Em Franco da Rocha, os alunos relatam que em julho, apesar das baixas temperaturas, os adolescentes andavam de camiseta de malha e chinelos de dedo. Quando chovia, entrava água nas celas.
No dia 9 de agosto, os estudantes presenciaram quando os funcionários paralisaram suas atividades e os adolescentes "dominaram a casa". Nessa noite, os alunos viram dois monitores retirarem do carro três porretes utilizados, segundo eles, para espancamento. Dois dias depois, um interno morreu em rebelião.

Outro lado
O reitor da PUC, Antônio Carlos Caruso Ronca, disse que o papel da PUC é apontar as falhas da Febem e ao mesmo tempo ajudar a capacitar a instituição para que ela tenha mais condições de reinserir os infratores na sociedade. Além disso, segundo Ronca, o projeto do núcleo é atender infratores em meio aberto, o que reduziria as internações.
O presidente da Febem, Benedito Duarte, disse desconhecer a existência de estagiários da PUC nas unidades. Segundo ele, a fundação tem total interesse em manter a atual parceria (do programa em meio aberto) com a universidade.


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