São Paulo, segunda-feira, 26 de março de 2001

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ACIDENTE EM ALTO-MAR

Equipamento, que só deveria permitir passagem de óleo e água, teria injetado gás no tanque de resíduos

Falha em válvula pode ter causado explosões

PEDRO SOARES
ENVIADO ESPECIAL A MACAÉ

O defeito em uma válvula pode ter sido responsável pela pressurização do sistema de ventilação do tanque de resíduos e pelo entupimento do abafador de chamas, principais problemas apontados três dias antes do acidente na P-36 pelos boletins diários da unidade da Petrobras.
Segundo a Folha apurou, essa válvula fica no duto que liga um dos vasos de separação de gás, óleo e água ao tanque de resíduos, localizado na coluna da plataforma que explodiu.
O equipamento, que deveria apenas dar passagem ao óleo e à água que sobram do processo de separação, permaneceu aberto e permitiu a liberação de gás para o tanque de resíduos.
A entrada de gás teria pressurizado o sistema de ventilação e causado três explosões no último dia 15, que acabaram provocando o afundamento da P-36.
O sistema de separação é composto por quatro ou cinco vasos -grandes compartimentos que armazenam o óleo bruto que vem diretamente do poço. E separa, por diferença de densidades, o óleo, o gás e a água, que sobem misturados por dutos do fundo do mar.
Esse processo é gradativo, separando no primeiro vaso "o grosso", depois retirando o resto dos resíduos e armazenando no tanque. É semelhante ao tratamento de filtragem da água encanada.
Com a válvula aberta, o gás foi se concentrando a pressões cada vez maiores no tanque e depois no sistema de ventilação. Qualquer faísca seria suficiente para provocar as explosões.

Bomba em manutenção
Outro problema que teria influenciado o acidente é que a bomba do equipamento de armazenar resíduos havia sido retirada para manutenção. Com isso, o tanque não era esvaziado de óleo e água.
Essa informação, obtida pela Folha com um ex-supervisor de produção de plataformas da Petrobras que ainda trabalha como operador, não é contraditória com o relato do supervisor da P-36 Sebastião Filho, que afirmou, em entrevista, que "o tanque estava inoperante e isolado".
O ex-supervisor afirma que, mesmo com compartimento de resíduos parado, só isso não seria causa de uma explosão. Isso porque o óleo armazenado libera gás, "mas em pequena quantidade, insuficiente para causar acidente".
Segundo ele, o que ocorreu, certamente, foi a falha na válvula, que deixou acumular muito gás em alta pressão no sistema, agravada pela manutenção na bomba do tanque.

Corta-chamas
Para o ex-supervisor, que disse ter ouvido esses problemas de vários funcionários da produção embarcados na P-36, o entupimento do corta-chamas se deve também ao vazamento de gás pela válvula. Isso porque, mesmo tendo passado por um processo de separação, o produto ainda não havia sido totalmente filtrado e carregava partículas de óleo.
Essas partículas foram se impregnando no corta-chamas, que entupiu e piorou a situação, uma vez que o gás contido no tanque e no sistema de ventilação tinha menos espaço para sair.
O duto de ventilação opera com pressão atmosférica, menor do que a do gás comprimido nos vasos. E serve, justamente, para ventilar e dar passagem para o gás que eventualmente se aglomere no tanque de resíduos.
O corta-chamas é um equipamento de segurança usado para evitar que, em caso de incêndio causado pelo gás contido no duto de ventilação, o fogo volte para o tanque, o que poderia causar uma explosão. É feito com uma malha fina de aço, que impede o retorno das chamas.

Local errado
Segundo o ex-supervisor, o local onde estava o tanque de resíduos (em coluna de sustentação da plataforma) é, no mínimo, inadequado. "Qual a recomendação do corpo de bombeiros no caso de um bujão explodir? Não é colocar em lugar arejado e aberto? A Petrobras não seguiu a orientação."
Para ele, o fato de o tanque estar lá se deve à adaptação da P-36, inicialmente projetada como plataforma de perfuração e modificada para de produção para atender à Petrobras.
O ex-supervisor afirmou que teve a informação de que o tanque, no projeto original, era usado para acumular lama, retirada do fundo do mar durante a perfuração dos poços.


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