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URBANIDADE
"Cinema Paradiso"
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
As imagens produzidas
nesta semana em uma esquina de São Paulo inspirariam
um belo roteiro no estilo de "Cinema Paradiso", um filme italiano que conta a história da
paixão de uma criança por um
cinema. Voltemos à primeira cena, 47 anos atrás.
Por causa das freqüentes invasões das vacas, os pais de Fernando Meirelles decidiram erguer uma cerca para proteger os
jardins da casa, que ficava na
então longínqua praça Panamericana, no Alto de Pinheiros, onde moravam. O cine Belas Artes,
na movimentada esquina da
Consolação com a Paulista, tão
distante da pasmaceira bucólica,
exercia especial fascínio sobre o
menino. "Foi um dos lugares em
que aprendi a gostar de filmes",
conta Meirelles.
Anos depois, o Belas Artes, falido, abandonado, estava para fechar as portas. Mas, ao contrário
do que ocorre em "Cinema Paradiso", foi salvo -e isso graças,
em parte, ao menino que virou
cineasta mundialmente reconhecido com "Cidade de Deus".
"Quando se divulgou que o Belas
Artes iria fechar, toda uma geração ficou entristecida."
Foi uma feliz coincidência.
Meirelles estava mesmo interessado em ter um lugar para mostrar filmes sem nenhum apelo
comercial. Tentou construir um
cinema no meio da Vila Madalena, mas acabou desistindo.
Soube então que um grupo, liderado pelo distribuidor de filmes
André Sturm, estava atrás de patrocinadores para evitar o fechamento do Belas Artes e resolveu
associar-se ao projeto.
Como está com os dois pés no
mundo, viajando sem parar,
Meirelles quer tirar proveito das
conexões internacionais para
trazer filmes que dificilmente
chegariam ao Brasil. "Há filmes
fantásticos de diretores fora do
circuito comercial. Vamos mostrá-los em primeira mão."
Justamente por estar com os
pés no mundo -neste momento, vive na ponte aérea entre Europa e África- ele não vai presenciar este momento culturalmente histórico para algumas
gerações de paulistanos, que
cresceram, aprenderam arte e
namoraram naquela esquina
-muitos dos quais não conseguiam passar por ali, vendo tudo
caindo e sujo, sem sentir uma
ponta de nostalgia.
Vamos à última cena. Sugestivamente, o cinema reabriu, na
segunda-feira, com um filme intitulado "O Outro Lado da Rua".
E-mail - gdimen@uol.com.br
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