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São Paulo, sábado, 26 de julho de 2003

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SAÚDE

Posição era ocupada por acidentes de carros; maior parte das vítimas foi atingida em assaltos, brigas ou por bala perdida

Tiros lideram causa de lesão medular em SP

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os disparos de armas de fogo lideram o ranking de causas de lesão medular em São Paulo, posição anteriormente ocupada pelos acidentes de trânsito. Os tiros também aparecem nas estatísticas de paralisia facial, lesões no cérebro e amputações dos principais serviços de reabilitação da capital.
A maioria dos lesionados foi baleada durante assaltos, brigas, sequestros ou em situações de bala perdida. Só na AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), quase a metade dos pacientes paraplégicos (paralisia dos membros inferiores) e tetraplégicos (paralisia dos quatro membros) é vítima da violência urbana.
No Brasil, cerca de 7.000 pessoas ficam paraplégicas ou tetraplégicas por ano. Desse total, 32% foram vítimas de armas de fogo, e 19%, de acidentes de carro. Nos EUA, 45% dessas lesões estão relacionadas a acidentes de trânsito, e 15%, a armas de fogo.
Na AACD, em média 190 pessoas são atendidas por ano vítimas de lesão medular provocada por tiros. Atualmente, 280 paraplégicos e tetraplégicos aguardam por até quatro meses o início do tratamento na fila de espera.
Segundo o ortopedista Antônio Carlos Fernandes, diretor clínico da AACD, em 1985 os acidentes de trânsito eram responsáveis por 45% dos casos de paralisia por traumas atendidos na instituição, enquanto as armas de fogo respondiam por 25%. Em 2002, os acidentes causaram 30% das lesões de medula, e os tiros, 47%.
No Lar Escola São Francisco (Lesf), serviço de reabilitação ligado à Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a situação é bem parecida. De 171 portadores de lesão medular avaliados por um estudo, 30% foram vítimas de armas de fogo, enquanto os acidentes de trânsito foram responsáveis por 9% das ocorrências.
Segundo a médica fisiatra Therezinha Rosane Chamlian, diretora técnica do Lesf, entre as vítimas de armas de fogo, 34% foram baleadas em assaltos. A idade média dos pacientes é de 35 anos. "A violência está levando a um grave problema de saúde pública. A maioria dessas vítimas é lesionada no auge de sua vida produtiva. Temos de incentivar muito o desarmamento da população", diz.
Na opinião do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ), o "cidadão de bem" deve ter o direito de portar uma arma em casa para defender sua família contra os bandidos. "A maioria dos crimes é praticada com armas ilegais", afirma Jefferson.
No serviço de reabilitação do Hospital das Clínicas de São Paulo, 29% dos 220 pacientes com lesão de medula óssea foram vítimas de tiros, enquanto 18% ficaram paralíticos após se envolverem em acidentes de trânsito.

Face
A face é outro local do corpo que acaba sendo alvo da violência. O ambulatório do Hospital das Clínicas de São Paulo atende por mês em média seis pessoas vítimas de balas no rosto. Segundo o otorrinolaringologista Ricardo Bento, chefe do ambulatório, a maioria é vítima de assaltos no semáforo ou de brigas. Em décadas passadas, o serviço recebia muitos casos relacionados a tentativas de suicídio. Hoje, recebe em média um caso de tentativa de suicídio por mês que leva à paralisia facial.
A frequência desse tipo de lesão relacionada à violência urbana impressionou a classe médica internacional. Tanto que, desde 1996, Bento passou a ministrar nos EUA um curso voltado a médicos sobre como tratar as lesões.


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