|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SAÚDE
Vaidade, vergonha e preço desestimulam quem não ouve direito a procurar tratamento; estimativa é que 7 mi não procuram atendimento
Idoso teme estigma do aparelho auditivo
FERNANDA CALGARO
DA REDAÇÃO
Quando uma pessoa não enxerga bem, procura um oftalmologista e passa a usar óculos sem nenhum constrangimento ou vergonha. Porém, por medo de ser
estigmatizado, muitas vezes,
quem tem dificuldade para ouvir
não reconhece a necessidade de se
consultar com um médico otorrinolaringologista e rejeita o uso do
aparelho auditivo.
Associado normalmente à senilidade, esse tipo de deficiência esbarra no preconceito existente
principalmente entre as pessoas
da terceira idade, que refutam a
idéia de admitir e mostrar que sofrem desse problema.
"O uso do aparelho é estigmatizante, porque muitas vezes a deficiência auditiva é tratada pelas
pessoas meio na gozação, de forma pejorativa", afirma a diretora
da faculdade de fonoaudiologia
da PUC/SP (Pontifícia Universidade Católica), Altair Cadrobbi
Pupo, a professora Lila. Outro
motivo alegado pelo não uso do
aparelho é a questão estética.
"Existem casos em que a pessoa
não usa por pura vaidade", diz.
Há também a questão financeira,
pois o preço do aparelho, dependendo do modelo e da tecnologia,
pode variar de cerca de R$ 1.000 a
cerca de R$ 7.000.
Ainda sim, Pupo ressalta que
nos últimos anos a aceitação pelo
idoso tem sido cada vez maior. "A
pessoa da terceira idade está mais
preocupada em garantir qualidade de vida e ter inserção social",
avalia. "Além disso, os aparelhos
têm se modernizado e estão mais
potentes e miniaturizados, o que
os torna muito discretos."
Convívio social
Segundo dados estimados da
Sociedade Brasileira de Otologia
(SBO) -ramo da medicina que
se ocupa dos ouvidos-, dos quase 18 milhões de idosos no Brasil,
o equivalente a cerca de 10% da
população do país, aproximadamente 70% das pessoas acima de
65 anos -ou 12 milhões- têm
alguma perda auditiva. Desse total, 7 milhões (ou 60%) precisariam de aparelho de amplificação
sonora, mas não o fazem por preconceito ou desinformação.
Para o otorrinolaringologista e
diretor da SBO, Luis Carlos Alves
de Sousa, "as limitações da surdez
são bem maiores do que as da cegueira, porque prejudicam, entre
outras coisas, a abstração do pensamento". "O idoso é alijado do
convívio social. Ele se sente um
estorvo. Precisa aumentar muito
o volume da televisão para ouvir e
atrapalha o resto da família. Não
consegue participar das conversas e acaba se isolando", relata
Sousa. "A convivência saudável é
fruto de uma boa audição."
"Meu contato com o mundo
melhorou 90%. Antes ficava mais
recluso e disperso nas conversas,
agora estou mais participativo",
conta o aposentado Francisco
Mellinger, 75, que usa aparelho
auditivo há três meses. "Estou radiante com essa nova realidade".
A dona-de-casa Itália Simões
Santos, 78, ou Nina, como é chamada, compartilha dessa opinião.
"Começaram a falar que eu já não
estava mais escutando direito,
não entendia parte da conversa. E
eu não queria me isolar."
Miniatura
O aparelho de amplificação sonora individual (AASI) é um dispositivo eletrônico que aumenta
os sons, possibilitando que o indivíduo com deficiência auditiva
consiga escutar.
Os modelos de aparelhos são o
retroauricular, que é colocado
atrás da orelha e é indicado para
perdas leve a severa, e os intra-aurais, que ficam dentro da orelha e
se subdividem em intra-auricular,
intracanal e microcanal. No caso
dos intra-aurais, os aparelhos são
confeccionados a partir do molde
da orelha da pessoa. O intra-auricular ocupa a parte da concha e o
conduto auditivo. Já o intracanal
ocupa o conduto auditivo e uma
parte da concha, enquanto que o
microcanal fica no conduto auditivo externo. Os tipos de tecnologia são analógica, digital e híbrida,
que é uma mistura das duas primeiras.
Segundo Deborah Ferrari, fonoaudióloga do Centro de Pesquisas Audiológicas do Hospital
de Reabilitação de Anomalias
Craniofacias (Centrinho), da
USP, em Bauru, "o paciente deve
ter em mente que o aparelho supre as dificuldades causadas pela
perda da audição, mas não substitui o ouvido humano".
Texto Anterior: Mortes Próximo Texto: Deficiência só é percebida em estágio avançado Índice
|