São Paulo, terça-feira, 27 de março de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo corta R$ 12,6 milhões do orçamento de educação especial, que cuida de alunos portadores de deficiências, como a visual e a auditiva

Escrita braile exige régua ou máquina

MARCIO RODRIGUES LOATTI
DA EQUIPE DE TRAINEES

A alfabetização depende muito da visão. Mas quem não enxerga pode ler e escrever com muita facilidade usando o tato por meio do braile. O francês Louis Braille inventou esse sistema em 1825 e deu sua versão definitiva e universal em 1837.
A combinação de seis pontos em relevo constitui a cela braile. Cada cela braile pode formar qualquer uma das 63 combinações que representam o alfabeto, as vogais acentuadas, os sinais de pontuação, os numerais, os símbolos matemáticos.
Para ler em braile utiliza-se a ponta do dedo indicador de uma das mãos. Por meio de uma leve pressão sobre os pontos é possível a percepção dos sinais.
"É fundamental que eles tenham decorado as letras para que saibam escrevê-las e reconhecê-las", diz Marifátima Nunes, professora do Instituto de Cegos Padre Chico, em São Paulo, que oferece ensino gratuito a 124 deficientes visuais e tem dez crianças na 1ª série.
As crianças escrevem fazendo uso da máquina ou da reglete e punção -utilizados por alunos que não têm deficiência motora. A reglete é uma régua dupla de metal que tem as celas braile. O punção é como se fosse a caneta com que se escreve em braile.

Da direita para a esquerda
O papel é colocado entre as duas partes da régua e escreve-se da direita para a esquerda com o punção, preenchendo cada cela braile com seu respectivo relevo.
Já para a leitura é preciso virar a folha a fim de sentir o relevo que foi feito, passando a ponta do dedo da esquerda para a direita.
Existe também a máquina de datilografia em braile. Ela tem nove teclas, seis delas correspondentes aos seis pontos da cela braile.
O toque de uma ou mais teclas produz a combinação de pontos em relevo correspondente ao símbolo desejado. Depois é só pressionar a tecla central para proceder à escrita do próximo sinal. A tecla da esquerda do teclado principal é para mudar de linha, a da direita, para retroceder.
Quando as crianças se familiarizam com o alfabeto, a professora passa ensinar as palavras. As crianças são estimuladas, por exemplo, a formar palavras com "ar". "Elas falam armário, armadilha e escrevem; surgem as dificuldades, por exemplo, o "lha" elas escrevem "lia", então apresento outras famílias."
Sempre se procura apresentar o concreto antes de grafar as palavras. Por isso, o instituto tem animais empalhados e todo ano leva as crianças para a fazenda Estação Natureza, em Santo Amaro (SP).
Marifátima aponta como a principal dificuldade no processo de alfabetização de deficientes visuais a marca da oralidade. "As crianças falam "palitu", "bolu", e querem escrever com "u", por isso é importante pronunciar corretamente as palavras para eles."

Inclusão irresponsável
O orçamento da Seesp (Secretaria de Educação Especial) complementa as políticas do MEC de educação comum, como o Renda Mínima e o transporte escolar, ou seja, serve para capacitar professores e adaptar livros.
Este ano, o orçamento previsto teve uma redução de R$ 12,6 milhões, ou seja, de 38%, se comparado com o previsto para 2000, conforme o coordenador-geral de planejamento da Seesp, Reinaldo Estelles.
"Na verdade não houve redução; houve um crescimento atípico ano passado devido a emendas parlamentares, e não se repetiu a dose para este ano", afirma Luciano Oliva Patrício, secretário-executivo do MEC.
O livro didático para portadores de deficiência segue as normas do Programa Nacional do Livro Didático, sendo que para os deficientes visuais é necessário realizar a transcrição para o braile.
O atendimento pode ser feito em escolas com classes comuns integradas a salas de recursos, em classes especiais ou em escolas especiais. A Seesp quer a inclusão do portador de deficiência na rede regular de ensino com o apoio pedagógico da sala de recurso.
Mas tal orientação tem provocado muita controvérsia entre os educadores. Segundo Nely Garcia, professora da Faculdade de Educação da USP, faltam professores capacitados para alfabetizar em braile em São Paulo. "É a inclusão irresponsável."
"O ensino público está muito ruim pelo excesso de alunos", afirma a professora Auta Aihara, que dá aulas tanto no instituto como na sala de recursos da escola pública Caetano de Campos.
Segundo o censo escolar, ocorreu um aumento de 27% no atendimento do aluno com necessidades especiais em classes comuns de 1999 para 2000, ou seja, passou de 59,2 mil para 75,3 mil. No total, 356.151 alunos especiais foram atendidos no país em 2000.


Texto Anterior: Ação do MEC é alvo de críticas
Próximo Texto: Surdos aprendem duas línguas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.