São Paulo, Quarta-feira, 27 de Outubro de 1999
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O que fazer agora que já é tarde demais?


BARBARA GANCIA
Colunista da Folha

Vamos ser honestos? Então, tá. Eu abro o meu coração e você abre o seu. Eu começo: não tinha a menor idéia de que a situação das crianças da Febem fosse tão dramática. Não sabia que elas passam o dia sentadas no chão, de cabeça baixa, como prisioneiros de campo de concentração. Não tinha noção de que elas tomam banho, quando tomam, com água suja. Não sabia que elas dormem amontoadas, como os presos das delegacias superlotadas, e tampouco tinha conhecimento de que a maioria delas tem pai e mãe.
Foi preciso que a televisão e os jornais mostrassem as rebeliões dos últimos dias e que a gente ficasse sabendo do degolamento de uma criança para que a Febem virasse tema de conversa do pessoalzinho com quem convivo.
Pouco antes de começar a escrever este texto, falei sobre a Febem com um amigo e disse que estava a fim de fazer alguma coisa. Contei a ele que li em algum lugar que o Natal na Febem é a coisa mais triste do mundo e que quero fazer alguma coisa para ajudar. Meu amigo disse que, nos últimos dias, tinha pensado a mesma coisa. Ele é artista plástico e também não conhecia a situação daquelas crianças. Contou-me que estava pensando seriamente em se candidatar para dar aulas de desenho aos internos da Febem.
Concordo. São atitudes ingênuas e motivadas pela constatação do tamanho do pouco caso que temos por essas crianças.
Mas cada um paga seu dízimo como pode. Quantas vezes você acreditou naquele representante da LBV que ligou para a sua casa? Nas poucas ocasiões em que concordei em contribuir não tive mais paz. Eles enfiam o seu nome em uma listagem de mala direta e você nunca mais consegue se livrar dos telefonemas.
Como milhares de outros cidadãos, faço minha parte ajudando organizações e pessoas que conheço de perto. Ocorre que, até as rebeliões começarem, eu sabia muito pouco sobre a Febem. Aliás, pelo que a gente tem visto e lido, poucos sabiam o que se passava lá dentro. Caso contrário, no mínimo, já teriam tratado de mudar o nome da entidade, de Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor para Fundação do Mal-Estar do Menor ou Fundação Para a Formação de Assassinos Sanguinários.
Ajudar os menos favorecidos é obrigação fundamental de quem vive em sociedade. E já que o governo não usou o dinheiro dos nossos impostos para encaminhar essa molecada, só nos resta agora ir pessoalmente ver o que pode ser feito.

QUALQUER NOTA

Balela
Ron Dennis, chefão da McLaren, declarou que a decisão da FIA de absolver a Ferrari desacredita a entidade. Pois, para quem não sabe, Joe Bauer, o comissário que desclassificou a equipe em Sepang, foi funcionário da Mercedes.

Ar quente
Alguém precisa avisar a embaixada americana que Itamar Franco é a encarnação da expressão "fogo de palha".

Flashback Recebo um fax da PM avisando sobre uma nova droga. Trata-se da "tattoo", tatuagens com temas como o Mickey e o Bart Simpson, que, segundo a PM, contêm LSD. Posso estar enganada, mas essas tatuagens não são mais velhas do que o Timothy Leary?

E-mail: barbara@uol.com.br

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