São Paulo, Quarta-feira, 27 de Outubro de 1999
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GUERRA DOS MENINOS

Falta de fichas dificulta identificação de corpos carbonizados e localização de internos transferidos

Febem não consegue saber quem morreu, quem fugiu na rebelião

JOÃO CARLOS SILVA
MARCELO OLIVEIRA
da Reportagem Local

Um dia depois de terminada a maior rebelião da Febem, mães de internos continuam desesperadas sem conseguir saber se seus filhos estão vivos ou mortos.
A Febem afirma que quatro internos morreram na rebelião. Dois foram identificados e um, enterrado ontem. Outros dois, cujos corpos foram carbonizados, continuam sem identificação.
O problema é que a Febem não consegue ter uma relação dos sobreviventes, de quem continua na Febem Imigrantes (zona sudeste de São Paulo, onde ocorreu a rebelião de 18 horas), de quem foi transferido para outra unidade e de quem fugiu.
Pelas listas divulgadas ontem, a Febem ainda não havia determinado o paradeiro de 236 dos 1.216 menores que estavam na unidade no último sábado. Acredita-se que 119 fugiram.
"Meu filho não está em nenhuma lista. Já perguntei para funcionários da portaria 1 milhão de vezes. A resposta é sempre a mesma, tenho que esperar", disse Maria Lúcia Emiliano, 32, que buscava informação sobre o filho S., 17, desde às 9h de anteontem.
"Moço, pelo amor de Deus, quero informação sobre meu filho", dizia Damiana Pereira Lima Silva, 44, a um funcionário que afixava listas com nomes de menores do lado de fora da unidade.
"Se ele não está nas listas, tem de esperar", ele respondeu.
"Eu estou desesperada. Eles dizem que menores morreram, mas não falam seus nomes. Dizem que meu filho pode ter fugido, mas em casa ele não chegou", reclamava a mãe do menor E., 16, Antônia Ambrósio Leite, 44.
Mesmo para aqueles que conseguiam encontrar nome de parentes nas listas, a informação não era suficiente.
"Meu irmão não estava nas listas ontem (anteontem). Depois que passei o nome para funcionários, o nome dele apareceu nas listas hoje (ontem). Como vou saber se ele está mesmo aí", disse Eliana Mendes, 24.

Identificação
O Instituto Médico Legal ainda não sabe como fará a identificação dos corpos de dois internos mortos que estão carbonizados.
Técnicos do instituto recolheram ontem à tarde fragmentos de tecidos de ambos, que serão congelados para exame de DNA.
O exame, que custa US$ 1.500, só será feito se a família da vítima tiver dúvidas no reconhecimento, mas apontar indícios de que o corpo pode ser realmente de um parente.
Ontem, o IML enviou à Febem a impressão digital retirada do polegar, preservado do fogo, de uma das vítimas carbonizadas.
Mas a Folha apurou que a identificação é também difícil porque os internos, durante a rebelião, destruíram a administração da Febem Imigrantes. Ou seja, os prontuários dos adolescentes, que inclui ficha papiloscópica (impressões digitais), foram queimados.
Além do DNA e das impressões digitais, o IML poderá fazer a comparação das arcadas dentárias dos corpos com as fichas odontológicas das vítimas, caso existam.
Também poderá ajudar na identificação radiografias que as famílias possam ter das vítimas.
Se alguma vítima tinha um raio X de crânio, a imagem poderá ser sobreposta a uma radiografia do cadáver para comparação dos "seios da face", leves depressões do crânio, que são diferentes de pessoa a pessoa.


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