São Paulo, Quarta-feira, 27 de Outubro de 1999
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Escolas de Heliópolis vão à luta contra a violência

da Reportagem Local

No meio do temor provocado pelas ameaças do toque de recolher nas imediações da favela Heliópolis (zona sudeste de SP), onde a maioria das escolas tem dispensado seus alunos mais cedo, duas se sobressaem desenvolvendo um trabalho na contramão dessa onda de violência.
Uma procura conhecer e respeitar a história de vida dos alunos, estimulando iniciativas próprias. Outra busca uma aproximação com a comunidade, envolvendo alunos, pais e moradores em atividades promovidas pela escola.
Conhecendo a história de seus alunos, a Escola Municipal Péricles Eugênio da Silva Ramos está conseguindo vencer um desafio: a indisciplina dos estudantes.
São atendidos diariamente pela escola cerca de 800 crianças e adolescentes da 1ª à 8ª série do ensino fundamental. A maior parte é habitante da favela Heliópolis.
Na escola, que funciona até as 17 horas, o clima de tensão não chegou. Segundo Cristina Drumont, coordenadora pedagógica, apesar do toque de recolher, a rotina da escola não foi alterada.
O trabalho dessa escola não é recente. A pesquisa teve início há cerca de um ano, quando pós-graduandos da Universidade Cidade de São Paulo (Unicid) começaram a realizar um estudo para encontrar alternativas de formação de professores.
Em entrevista com os professores, os pesquisadores descobriram que a principal queixa era com relação ao comportamento dos alunos. Ao verificarem o outro lado da questão, encontraram crianças com uma história de vida bastante complicada, marcada por sofrimento e perdas.
"Em nenhum momento percebemos uma indisciplina intencional. Mas esses eram os códigos de sobrevivência que eles conheciam", afirma Ana Gracinda Queluz, que, com Ecleide Cunico Furlanetto, coordena a pesquisa.
Na tentativa de modificar a situação, os professores indicaram alunos que passaram a ser "investigados" pelos pesquisadores. Todas as semanas, cerca de 15 crianças consideradas indisciplinadas são entrevistadas.
Nesse período, elas contam sua história por meio de desenhos e frases. Como a escola se interessou pelo resultado, os professores têm transposto as conclusões da pesquisa para a sala de aula.
Os resultados já começam a ser detectados. Segundo Cristina Drumont, os professores estão convivendo com novos alunos. "O comportamento melhorou."
A Escola Municipal de Primeiro Grau Campos Sales é uma das poucas nos arredores de Heliópolis que não permitiram que seus alunos fossem dispensados mais cedo. "Não tenho medo porque nosso segredo é a integração com a comunidade", diz o diretor, Braz Rodrigues Nogueira.
A escola está organizando comissões de pais e professores com diferentes temas, como limpeza e conservação, reivindicações, integração escola-comunidade e lazer, esporte e cultura.
O projeto nasceu de encontros em que se discutiu educação e cidadania com os pais. Segundo Nogueira, desde que os projetos começaram a funcionar, há dois anos, os casos de brigas dentro da escola caíram de seis por dia para dois por mês.
(CLEIDE FLORESTA)
(PRISCILA LAMBERT)


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