São Paulo, sábado, 27 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SAÚDE

Estudo indica que mulheres são mais atingidas pela doença no Brasil; instituto prevê 467 mil novos casos em 2005

Regiões mais ricas têm maior taxa de câncer

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

Ontem, Dia Nacional de Prevenção do Câncer, o Instituto Nacional de Câncer, Inca, veio com a má notícia: "Em 2005, são esperados 229.610 casos novos para o sexo masculino e 237.830 para o sexo feminino".
A profecia está entre os números da "Estimativa 2005 para Incidência de Câncer no Brasil", um calhamaço de 96 páginas que mapeia onde e como a doença deve atacar no próximo ano.
Fruto do cruzamento de informações obtidas nos Registros de Câncer de Base Populacional, supervisionados pelo Inca, e do Sistema de Informação sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde, a "Estimativa-2005" aponta pistas para a compreensão dos critérios pelos quais o câncer escolhe suas vítimas. Abaixo, algumas delas:
1. Ser mulher é ser mais suscetível ao câncer, ao menos no Brasil.
2. Morar no Sul-Sudeste é estar mais vulnerável à doença do que morar no Norte-Nordeste.
3. Morar nas Capitais é estar mais próximo do risco do que morar no interior.
A explicação para essas tendências quem dá é a pesquisadora Gulnar Azevedo e Silva Mendonça, coordenadora de Prevenção e Vigilância do Inca: "Já se sabe que a vida sedentária, a dieta rica em gorduras e pobre em fibras, além do tabagismo, entre outros fatores, predispõem ao aparecimento de alguns tipos de câncer, como de próstata, de mama e de pulmão. Já a pobreza está relacionada ao surgimento de outros tipos, como de estômago e de colo de útero. O Brasil de hoje já sofre com os cânceres do desenvolvimento, sem ter resolvido aqueles típicos do subdesenvolvimento".
Pelo argumento, fica fácil entender por que a mulher brasileira tornou-se alvo preferencial do câncer, ao contrário dos que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, que apresenta taxas de incidência da doença em homens de 600 casos para cada 100 mil habitantes, contra 400 em mulheres.
Se mora em uma área desenvolvida, a mulher expõe-se ao risco típico da vida moderna, representado pelos cânceres de mama e pulmão. Se, ao contrário, mora numa área subdesenvolvida, ainda será vítima do câncer de colo de útero.
Em 2005, o Brasil ainda vai ter 20.690 mulheres com câncer de colo de útero -doença típica de países muito atrasados, já que é possível evitá-la com um simples exame de papanicolaou. Não é casual, assim, que, na região Norte, uma das mais carentes de serviços de saúde, o câncer de colo de útero seja o mais freqüente, excluídos os tumores de pele não-malignos.
No outro extremo, entre as mulheres que moram em áreas desenvolvidas do Sul e Sudeste, o câncer prevalente é de outro tipo.
O médico oncologista Sergio Simon explica: "A incidência do câncer de mama vem crescendo desde os anos 50. Nos Estados Unidos, até meados do século passado, uma em cada doze mulheres desenvolvia esse tipo de câncer. Hoje, esse índice subiu para uma em cada nove".
Diz-se que esse tipo de câncer é típico de países desenvolvidos porque atinge preferencialmente mulheres que trocaram os trabalhos domésticos e a lida com uma prole extensa por uma vida profissional e com prole reduzida. "Com menos filhos, essas mulheres menstruam pelo menos três vezes mais do que acontecia com suas avós, há 60 anos", explica Simon (leia texto nesta página).
Alie-se o número muito maior de menstruações a tabagismo, alcoolismo, obesidade e sedentarismo e tem-se a receita de hábitos hiperfavoráveis ao surgimento do câncer de mama.
É situação típica de mulheres que vivem nos centros urbanos e é essa a explicação da prevalência desse tipo de câncer observada entre habitantes nas capitais versus a média nacional.
São 52,93 casos novos para 100 mil mulheres na média nacional, contra 82,55 casos novos nas capitais. Morar numa capital significa, portanto, 56% mais chances de ter um câncer de mama.
Se o quadro já não é bom para as mulheres, deve ficar pior. O número de novos casos de câncer de pulmão estimados para o Brasil em 2005 é de 17.110 entre homens e 8.680 entre as mulheres. O risco estimado é de 19 novos casos para cada 100 mil homens e de 9 para cada 100 mil mulheres.
Neste caso, também, os riscos para quem mora nas capitais é maior. Serão 25,95 novos casos para 100 mil homens que moram nas capitais, contra 18,88 de média nacional. Para as mulheres, serão 9,31/100 mil na média, contra 12,78/100 mil nas capitais.
A menor incidência do câncer de pulmão entre as mulheres, quando comparada às taxas em homens, pode induzir ao erro de se acreditar que esse tipo de câncer seja um problemão para "eles" e um probleminha para "elas".
Não é assim. "O problema é que o hábito do tabagismo demora algo entre 20 e 30 anos para impactar as estatísticas sobre câncer de pulmão", explica o doutor Simon. "Como os homens começaram a fumar em massa ainda nos anos 20, as estatísticas epidemiológicas já mostram a devastação operada pelo tabagismo. Nas mulheres, que começaram a fumar na década de 70, os efeitos ainda estão se fazendo sentir", diz Simon.
Isso explica, segundo a pesquisadora Gulnar, do Inca, por que "as taxas em mulheres vêm aumentando, enquanto as taxas de câncer de pulmão em homens têm se mantido estáveis, com tendência ao declínio".
O câncer de pulmão preocupa por sua letalidade. Para 1,4 no- vos casos, o resultado é um óbito em conseqüência do tumor. No câncer de próstata, para efeito de comparação, acontece um óbito a cada cinco novos casos diagnosticados.

Texto Anterior: Universidade para todos: Relator amplia benefícios a particulares
Próximo Texto: Pesquisa destaca peso dos fatores ambientais
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.