São Paulo, sábado, 27 de novembro de 2010

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WALTER CENEVIVA

Pedra no caminho do processo


A causa da reforma do Código de Processo Civil é clara: o vigente é uma verdadeira colcha de retalhos

DESENVOLVE-SE ATUALMENTE uma luta surda que não chega ao conhecimento do grande público, porque está voltada quase com exclusividade para os profissionais que atuam em causas cíveis, sejam juízes, promotores, advogados ou procuradores de órgãos públicos.
Apesar de não atingirem a população como um todo, os debates são importantes para a sociedade brasileira, sendo esse o motivo pelo qual o assunto surge nesta coluna. Não é exagero dizer que cada pessoa vivendo neste país poderá ser atingida pelos seus efeitos: trata-se da reforma do Código de Processo Civil.
A OAB-SP fez pormenorizada crítica ao projeto de reformulação da lei, que regula o andamento de todos os processos não penais, quando submetidos ao Poder Judiciário.
A entidade fala no risco de o texto sugerido ser aprovado até o fim do ano e, eventualmente, sancionado, o que parece pouco provável, em tempo de mudança de governo. Porém, chamar atenção para os defeitos apontados nunca é demais.
A causa dessa reforma é clara: o Código vigente é verdadeira colcha de retalhos, pior que a Constituição depois das muitíssimas alterações introduzidas. O leitor precisa saber que tivemos um Código Processual Civil, editado em setembro de 1939, no regime ditatorial do Estado Novo de Getúlio Vargas.
O Código atual foi publicado em janeiro de 1973, com o marechal Emílio Médici na chefia do governo, sendo ministro da Justiça o processualista Alfredo Buzaid durante a ditadura militar, instalada em 1964.
O Código de Processo Civil foi impulsionado por Buzaid, com poder quase absoluto sobre o Congresso. Para evitar demora na aprovação, seu artigo 1.218 manteve em vigor 17 dispositivos da lei de 1939.
Muito antes de se tornar fiel servidor do governo militar, quando ainda dava aulas na Faculdade de Direito do largo São Francisco, Buzaid debateu seu anteprojeto, inclusive na pós-graduação da Academia.
Não foi o debate amplo e irrestrito, em matéria de elaboração legislativa tão relevante, mas significou pequena abertura.
O Código de Processo Penal é de 1941. A Lei de Introdução ao Código Penal, de 1940, e a de Introdução ao Código Civil, de 1942. A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é de 1943. O Código Tributário Nacional, de 1966.
Esses dados mostram que o Brasil de hoje tem leis elaboradas em governos autoritários e em governos eleitos pelo povo. O exemplo mais expressivo de votação livre é o do Código Civil de 2002, ao lado de centenas de emendas em leis aprovadas durante a ditadura. Foram mudanças introduzidas desde 1985, em regime de liberdade.
As lembranças históricas se destinam a afirmar que o debate intenso e extenso de qualquer codificação deve ser levado à exaustão, o que em face do Código de Processo Civil ainda se mostrou insuficiente, sobretudo na classe dos advogados.
Lendo os 13 pontos levantados este mês pela OAB-SP, fica patente que a discussão deve prosseguir.
O encaminhamento ao Senado não é, porém, um mal em si mesmo. Pode até estimular a participação efetiva de todos os segmentos interessados, entre os quais, predominará certamente a voz dos advogados, porta-vozes essenciais dos interesses do povo, grande prejudicado pela demora nos julgamentos.


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