São Paulo, terça-feira, 27 de dezembro de 2005

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MISÉRIA COLETIVA

Crianças e adultos vão a lixão em Ribeirão Preto, no interior de SP, para buscar alimentos jogados por empresa

Em aterro, menina come melão pela 1ª vez

JOEL SILVA
REPÓRTER-FOTOGRÁFICO

O barulho do motor do caminhão no aterro de entulho de construção civil de Ribeirão Preto (314 km de SP) é o sinal para que alguns adultos e crianças "garimpem" as verduras, legumes e frutas que serão jogadas fora. A cena acontece duas vezes por semana. O caminhão é da rede de varejão Cenourão, que lá despeja as sobras de suas cinco lojas.
Ontem, três adultos e cinco crianças iniciaram o "garimpo" assim que os funcionários começaram a jogar as sobras no aterro. Os adultos recolhiam as verduras e legumes e as crianças separavam as frutas. No transporte, usavam as caixas jogadas pelo varejão.
"Mesmo um pouco maduras, dá para comer", diz uma garota de seis anos. Ela diz que só experimentou "um tal de melão", retirado dali, na semana do Natal. "Já estava jogando fora, achando que fosse melancia verde, quando minha mãe disse que era melão. Eu comi e gostei."
"Algumas coisas que não estão boas levamos para porcos e galinhas. O que está bom a gente leva para casa e come", disse um homem de cerca de 25 anos que se disse desempregado.
Uma "colheita" feita dois dias antes do Natal rendeu uma salada de frutas para os filhos de Regina Ferreira dos Santos, 55. Foi a única comida diferente no Natal. "Retirei frutas boas e fiz uma salada muito gostosa. Se não fosse isso, meus filhos teriam comido apenas arroz e feijão."
A secretária da Cidadania de Ribeirão Preto, Adair Pessini, não sabia do caso. "Mandarei verificar amanhã [hoje]." A Secretaria da Saúde também será acionada. "Se o varejão está jogando fora esses alimentos é porque o prazo de validade deve ter vencido."
A Folha tentou ouvir o Cenourão três vezes ontem à tarde. Funcionários disseram que o dono não estava e que a rede doa alimento a quatro creches.
Pessini acredita que as pessoas que recolhem alimentos no aterro devem participar de programas municipais. "Duvido que as famílias não estejam inscritas em um ou outro programa social. Temos 6.600 famílias inscritas no Bolsa-Família, além do Renda Mínima, Bolsa-Escola, Cartão Alimentação e Auxílio Gás, entre outros programas", afirmou.
Na última semana, segundo Pessini, foram feitos 1.900 cadastros de participantes de famílias que recebiam por outros programas e agora serão transferidos para o Bolsa-Família.
Segundo o Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), 3,32% (ou 6.640) dos domicílios de Ribeirão Preto têm renda per capita de até 1/4 do salário mínimo.


Colaborou MARCELO TOLEDO, da Folha Ribeirão

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