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SAÚDE
Sindicância que apurou denúncias de fraudes na fila de transplantes de medula conclui que "houve tratamento diferenciado"
Ministério identifica lobby e afasta dois
LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sindicância aberta no mês passado para investigar denúncias de
irregularidades no sistema de
transplante de medula óssea concluiu que houve tratamento diferenciado a paciente -mas não
identificou se a pressão veio de
políticos ou não. Detectou ainda
problemas burocráticos na autorização de um hospital para realizar esse tipo de cirurgia.
A apuração foi feita após denúncias de pressão política para
beneficiar pacientes apresentadas
pelo ex-diretor do Centro de
Transplantes de Medula Óssea
Daniel Tabak, quando ele pediu
demissão do cargo no início do
ano. O centro é ligado ao Inca
(Instituto Nacional de Câncer).
Nas denúncias de Tabak, ele
chega a citar pressões que teriam
sido feitas por deputados e até pelo vice-presidente da República,
José Alencar, que negou.
A comissão de sindicância não
aponta que tenha havido, por
pressão política, benefícios aos
pacientes nos casos investigados.
Mas ressalta que a assessoria parlamentar do ministério erra ao
encaminhar solicitações à área
técnica sem análise prévia.
Com base nas investigações, o
ministro da Saúde, Humberto
Costa, anunciou ontem o afastamento de dois funcionários: Diogo Mendes, coordenador do Sistema Nacional de Transplantes, e
Iracema Salatiel, coordenadora
do Redome (Registro Nacional de
Doadores de Medula Óssea), que
era subordinada a Tabak.
A decisão será publicada no
"Diário Oficial" da União de segunda-feira. Para Tabak, o afastamento da coordenadora provocará nova crise no Inca, com a possível demissão de outros diretores.
A investigação apontou ainda
indícios de que clínicas particulares teriam feito transplantes de
medula óssea sem conhecimento
e autorização do ministério.
Isso levou Humberto Costa a
solicitar ao Ministério da Justiça a
abertura de inquérito pela Polícia
Federal para apurar a atuação das
clínicas. "Vamos abrir a caixa-preta que era o transplante de medula óssea no Brasil. Acho que
não haverá desmoralização do
sistema. Pelo contrário, estamos
moralizando o setor", disse.
Em um caso analisado, de uma
paciente do interior de São Paulo
portadora de leucemia, a comissão aponta tratamento diferenciado do coordenador do sistema de
transplantes. Diogo Mendes, via
e-mails, solicitou informações diretamente a Iracema Salatiel, sem
passar pela direção do Inca.
Também determinou a pesquisa, em bancos internacionais de
doadores, de medula compatível
para a paciente, passando-a na
frente de outros que estavam na
fila dos exames. A paciente ainda
não fez o transplante.
Segundo Daniel Tabak, em uma
reunião, Mendes chegou a citar
que estava solicitando as informações por "determinação direta do
presidente da República em exercício [José Alencar]". À comissão
de sindicância, Mendes confirma
as palavras, mas diz que foram
descontextualizadas.
O relatório não acata a denúncia
de que houve pressão política. Em
relação a Iracema e Tabak, a comissão aponta que houve falhas
porque eles acataram a pressão de
Mendes. A Folha não conseguiu
localizar Mendes e Iracema para
comentar as acusações.
O outro caso denunciado por
Tabak e analisado na sindicância
é o do credenciamento do Real
Hospital Português, em Recife,
para realizar o transplante de um
menino. Segundo a denúncia de
Tabak, o pedido para que o caso
fosse resolvido teria sido feito pelo avô do paciente ao ministro
Humberto Costa, que nega.
Tabak diz ainda que o ministério não levou em consideração
seu relatório sobre o hospital, já
que a autorização foi dada antes
de o documento chegar.
A comissão de sindicância concluiu que o ministério concedeu a
autorização sem seguir a normalidade dos fluxos e trâmites administrativos, já que o pedido oficial
chegou após a autorização ter sido concedida. Mas, segundo o documento, a atuação é justificada
devido à gravidade do estado clínico do menino que seria operado
e poderia morrer. A fila de transplante, afirma, não foi furada.
Com base no relatório, o ministro decidiu mudar a forma de financiamento para a busca de
doadores nos bancos internacionais. Atualmente, o pagamento é
feito via convênio com a fundação
Ary Frausino, que repassa o recurso ao Inca. Uma comissão vai
estudar como viabilizar a contratação direta do serviço.
No ano passado, o governo gastou R$ 1,5 milhão. Para atender a
todos os 600 pacientes que aguardam transplante de medula óssea
no Brasil, pretende investir neste
ano R$ 24 milhões.
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