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RETRATO DO BRASIL
Pesquisa IBGE mostra que, nos últimos 11 anos, brasileiro teve mais acesso a serviços de saneamento
Oferta de água não tratada cresce 191%
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL
O brasileiro terminou a década
de 90 com maior acesso a serviços
de água, lixo, esgoto e drenagem,
mas, em alguns casos, precisa se
preocupar mais com a qualidade
desses serviços. É o que mostram
os dados da Pesquisa Nacional de
Saneamento Básico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgada ontem.
Segundo o instituto, de 1989 a
2000 o volume de água distribuído por dia para os domicílios brasileiros aumentou 57,9%. O problema é que, nesses 11 anos, o volume de água com tratamento
que chega às casas dos brasileiros
cresceu 52,5%, enquanto o volume distribuído sem tratamento
teve aumento de 191,3%, passando de 3,9% para 7,2% do total.
O problema é mais grave na região Norte, onde essa porcentagem chegou a 32,4% em 2000. O
IBGE ressalta, entretanto, que o
fato de a água não ser tratada não
significa, necessariamente, que
ela esteja contaminada.
"Frente a uma carência crônica
de investimentos em saneamento, ampliar a rede, levar a água, se
tornou prioridade. O tratamento
adequado implica recursos que
foram praticamente suspensos",
afirma Walder Suriani, dirigente
da Aesbe (Associação das Empresas Estaduais de Saneamento).
"Na região Norte isso é mais
sentido porque as empresas estaduais lá praticamente acabaram, e
os municípios menores não têm
condições financeiras de investir", completa Suriani.
Além disso, em mais da metade
(52%) dos distritos (bairros legais
de um município) brasileiros
abastecidos por rede geral de
água, não é feito controle da qualidade pelas Secretarias de Saúde.
A água é veículo para diversas
doenças, que matam 3,4 milhões
de pessoas por ano em todo o
mundo -a maioria delas crianças-, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde).
Entre as chamadas doenças de
veiculação hídrica estão diarréias,
disenterias, cólera, leptospirose,
amebíase, hepatite infecciosa, esquistossomose, febres tifóide e
paratifóide. Elas foram responsáveis, em 2000, por cerca de 888 mil
internações na rede pública de
saúde, segundo estatísticas do
SUS (Sistema Único de Saúde).
O presidente da Abes (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental), Antonio César da Costa e Silva, é um dos que
acreditam que R$ 1 investido em
saneamento representa uma economia de R$ 5 em saúde pública.
Os dados do IBGE foram levantados em 2000 nas companhias
ou órgãos públicos e privados responsáveis pelos serviços de saneamento. Eles revelam também
que a coleta de esgoto foi a área
em que o país menos avançou.
Quase todos os municípios brasileiros oferecem água encanada
(97,9%) e recolhem o lixo doméstico (99,4%). No que diz respeito à
coleta de esgoto, porém, a porcentagem é de apenas 52,2% e cresceu pouco: em 89, era de 47,3%.
Como a empresa que atua no
município nem sempre atende a
todas as casas e estabelecimentos
da cidade, a porcentagem de domicílios com rede coletora de esgoto era menor ainda em 2000:
apenas um terço deles (33,5%)
eram atendidos por esse serviço.
O destino final do esgoto é um
dado que mostra o quanto o país
precisa avançar na área. Do volume total de detritos coletados pela
rede, apenas 35,3% é tratado.
Em 84,6% dos distritos onde
não há tratamento, o esgoto é
simplesmente despejado in natura nos rios, o que compromete a
qualidade da água, encarece e dificulta o seu tratamento pré-distribuição, formando um ciclo vicioso classificado como "perverso" por Suriani. A opinião é compartilhada por Roque Passos Piveli, professor do Departamento
de Saúde Ambiental da Faculdade
de Saúde Pública da USP.
"Infelizmente, na prática, o fornecimento de água é a primeira
preocupação, seguida pelo afastamento do esgoto. Só depois que
cuidam disso é que se pensa no
tratamento dos detritos. O ideal é
que tudo fosse planejado de forma conjunta", completa.
O destino final do esgoto pode
afetar a qualidade da água consumida mesmo quando ele é despejado em fossas, e não em rios, solução mais comum em municípios onde não há rede coletora.
"Em distritos que utilizam a fossa séptica como destino final do
esgoto, geralmente há também o
aproveitamento de água subterrânea, que não é tratada. As fossas
podem comprometer a qualidade
dessa água, aumentando a concentração de nitratos, o que pode
causar até câncer", explica o engenheiro sanitarista Airson Medeiros da Silva, consultor da Abes.
Ele também faz a ressalva de
que o fato de a água não ser tratada não significa, necessariamente,
que ela chegue contaminada. Para
Silva, o IBGE mostra que o país
avançou em quase todas as áreas,
mas ainda não chegou ao ideal.
Metas
No texto de apresentação da
PNSB, o IBGE afirma que o Brasil
ainda nem conseguiu cumprir as
metas estabelecidas pelo Planasa
(Plano Nacional de Saneamento)
para a década de 80, de atender
pelo menos dois terços da população com serviços de esgoto.
Criado nos anos 70, o Planasa
não está mais em vigor, e o setor
de saneamento básico se ressente
da falta de uma política nacional,
que defina novas metas, aponte
possibilidades de financiamento e
estabeleça áreas prioritárias.
O projeto de lei nš 4.147, que
preencheria essa lacuna, ainda
aguarda uma votação na Comissão de Saneamento, onde precisa
ser pré-aprovado antes de ir para
o plenário da Câmara dos Deputados. "A aprovação da lei é importante para a universalização
dos serviços", afirma Suriani.
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