|
Próximo Texto | Índice
FEBEM
Crime ocupava quinto lugar em 2000 e o quarto em 2001; em junho, 9,8% dos 6.270 internos comerci alizava m drogas
Tráfico já é a 2ª causa de internação em SP
GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL
O patrão tem 14 anos. Os dois
empregados, 13 e 12. Pelas idades,
o negócio poderia ser uma simples brincadeira infantil, mas ele é
bem real e mostra um cenário
preocupante que cresce em São
Paulo. Os três montaram uma pequena "biqueira" para vender
drogas. O faturamento chegou a
R$ 600 por dia.
O adolescente G., o patrão, foi
preso em agosto de 2002, ano em
que as internações por tráfico na
Febem (Fundação Estadual do
Bem-Estar do Menor) paulista registraram um salto, tendência
mantida em 2003.
Quinto motivo de internação
em 2000, o tráfico passou hoje para o segundo lugar no ranking no
Estado, só perdendo para o roubo
qualificado. No país, o tráfico é o
quarto motivo de internação de
adolescentes, segundo pesquisa
divulgada pelo governo federal
em dezembro.
Dos 6.270 internos no mês passado em São Paulo, 619 (9,8%) foram parar na Febem por vender
drogas. Em dezembro de 2002, esse índice era de 9,2%. G. disse que
foi o azar que o fez entrar nessas
estatísticas da fundação.
Morador da zona sul de São
Paulo, que concentra maior número de internações por tráfico
da capital paulista, o adolescente
recusou diversos convites para
vender drogas. "Sempre quis ser
patrão. Ser empregado não dá dinheiro", afirmou.
Ele manteve a posição até surgir
a oportunidade de montar seu
próprio "negócio". Um amigo
traficante que não podia "trabalhar" por causa de um ferimento a
bala lhe entregou R$ 200 para que
comprasse e revendesse maconha. O amigo queria R$ 500 de
volta e o resto ficaria com G.
Procurou então os quatro traficantes mais importantes da região, contou a história do amigo
ferido e pediu permissão para instalar uma pequena biqueira. Autorização concedida, ele foi fazer
um "estágio" na biqueira maior
de outro amigo.
O adolescente disse que aprendeu tudo que precisava em 24 horas. Recrutou mais dois garotos
-um de 13 anos e outro de 12
anos- e estabeleceu um horário
rígido de "trabalho", sem folga semanal, como na biqueira maior.
Os "funcionários" trabalhavam
das 10h às 22h, de segunda a quinta. Na sexta e no sábado, começavam à noite e iam até a madrugada. No domingo, a venda iniciava
à tarde e se prolongava até as 22h.
O amigo que emprestou os R$
200 foi morto por um traficante
rival, segundo G. Sem precisar pagar a dívida e com "as vendas progredindo", o adolescente também
passou a vender cocaína.
Em três meses, comprou roupas
caras, uma moto usada -por R$
2.200- e se preparava para comprar um Chevette. Já era chamado
de patrão por amigos quando deixou a escola, onde estudava na 7ª
série do ensino fundamental.
Morando com cinco irmãos
-nenhum envolvido com o crime- , com a mãe dona-de-casa e
o padrasto que fazia bicos, o adolescente disse que tentava disfarçar o lucro da droga.
A moto Honda CG ficava na casa de um amigo. As roupas novas
eram sempre emprestadas. O dinheiro usado para comprar pizza
e refrigerante quase todas as noites era conseguido em pequenos
serviços feitos na região.
"Só souberam quando eu fui
preso. Minha mãe chorava e perguntava por que eu tinha feito
aquilo", disse o adolescente. Policiais invadiram sua casa e encontraram 150 gramas de maconha.
Um descuido: a droga sempre ficava com os dois "funcionários".
Hoje com 15 anos, há uma semana fazendo curso de informática na Febem, em São Paulo, G.
disse que aprendeu a lição. "Meus
verdadeiros amigos eram aqueles
que me diziam que o tráfico não
dava futuro." Dos seus dois "ex-funcionários", G. soube que abandonaram o tráfico após sua prisão. "Estão sossegados, como eu."
Próximo Texto: Franco da Rocha tem 15ª rebelião Índice
|