São Paulo, quarta-feira, 28 de agosto de 2002

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PLANO DIRETOR

Segundo Nabil Bonduki, José Mentor disse que, sem alterações propostas por vereadores, projeto não seria aprovado

Ex-líder do governo é responsável por emendas, diz relator

SÉRGIO DURAN
MELISSA DINIZ

DA REPORTAGEM LOCAL

O vereador Nabil Bonduki (PT), relator do substitutivo do Plano Diretor, aprovado na Câmara Municipal, afirma não saber da autoria das emendas que promovem mudanças pontuais no zoneamento da cidade, incluídas de última hora no texto final.
Em entrevista à Folha, ontem à tarde, Bonduki disse apenas que recebeu o pacote de emendas das mãos do vereador José Mentor, ex-líder do governo na Câmara, que coordenou a articulação política do plano desde o início, no ano passado.
Urbanista e professor da USP, o relator do substitutivo afirma não concordar com as emendas. Porém, de acordo com ele, um grupo de vereadores da base governista condicionou seu voto à inclusão delas. Leia, a seguir, trechos da entrevista:

Folha - Com as 160 emendas propostas, incluindo as que fazem mudança no zoneamento, que avaliação o sr. faz do substitutivo que está nas mãos da prefeita?
Nabil Bonduki -
De uma maneira geral, a avaliação é muito positiva. A gente fala em emendas, mas houve muita contribuição, no sentido de aperfeiçoar o plano, de ajudar a entender o que seria melhor. Eu não diria que o substitutivo é um somatório de emendas.
É um texto reordenado, incluindo várias questões novas, que vieram desse processo de debate. Muitas questões foram sendo recolhidas dos próprios vereadores, mas também de urbanistas, de entidades.
Foi um processo positivo, primeiro, por dar um bom encaminhamento à questão dos coeficientes e da outorga onerosa [taxa cobrada de quem construir acima de determinados limites". Nós conseguimos compatibilizar algumas preocupações, porque o projeto original tinha uma preocupação grande com a outorga.

Folha - A outorga onerosa era o ponto de conflito com as construtoras. Mudar apenas esse ponto foi o suficiente para resolvê-lo?
Bonduki -
Essa mudança foi um ponto de equilíbrio. Acho que não era tudo o que os representantes do mercado imobiliário queriam.

Folha - Pequenas mudanças no texto, que, de certa forma, favorecem um ou outro setor, como aquelas no zoneamento, não são negativas para o resultado final?
Bonduki -
Eu falei que, de uma maneira geral, o processo foi positivo. Continuo achando. Acho que há muitas emendas que nós trabalhamos no sentido de compatibilizar com uma idéia global que o plano tem, uma coerência. A única coisa que não é coerente são essas mudanças de zoneamento, independentemente de serem boas ou ruins.

Folha - O fato de a votação ter se estendido madrugada adentro sugere que muita coisa teve de ser negociada.
Bonduki - Não, a única coisa de última hora foram essas mudanças de zoneamento. Desde julho, quando apresentamos a proposta, muitas sugestões e emendas foram incorporadas.

Folha - Quando o sr. diz que as mudanças foram de última hora, o sr. quer dizer o quê? Quando as emendas chegaram?
Bonduki -
Na verdade, o projeto, depois de finalizado, exigiu um tempo de reorganização do texto. Quando a gente fala madrugada... Quando o projeto começou a ser lido?

Folha - 1h40...
Bonduki -
Pois é, para começar a ser lido à 1h40, é porque já estava impresso... Na verdade, não teve nada de madrugada, foi à noite.

Folha - Das 20h às 22h, era um sobe-e-desce de vereadores que diziam ir negociar com a liderança do governo.
Bonduki -
Nessa hora, não sei se havia negociação desse tipo, mas muitos desses vereadores, a essa altura, já tinham emendas feitas, compatibilizadas com o texto. A conversa com vereadores foi muito mais para mostrar que a emenda proposta foi incorporada ou não, mostrar o que estava finalizado. Essas emendas não foram apresentadas por nenhum vereador pontualmente, elas foram apresentadas em um conjunto de propostas de mudança.

Folha - Mas algum vereador que propôs mudança no zoneamento chegou a pressionar o sr., a perguntar se foi ou não incluída?
Bonduki -
Diretamente, não. Na verdade, a liderança de governo é que tinha solicitações desse tipo. Aí, foi esse momento final, foi a última coisa a ser conversada. Foi talvez às 21h, 22h. Foi um pouco demorado porque eu não queria incorporar nada...

Folha - Como surgiu o pacote de mudanças no zoneamento?
Bonduki -
Não eram propostas nominadas pelos vereadores, mas eram da base governista. Foram trazidas pelo José Mentor, que não é mais o líder do governo, mas como ele começou todo o processo, continuou.

Folha - Há informações de que alguns vereadores do PSDB teriam sugerido emendas.
Bonduki -
Eu não sei.

Folha - O que o sr. sabe?
Bonduki -
A única coisa que eu sei é que o Mentor trouxe as modificações para fazer.

Folha - O que ele falou quando apresentou as emendas?
Bonduki -
Ele falou que, se essas emendas não fossem em parte acolhidas, o projeto não poderia ser votado.

Folha - Ele disse quantos votos o governo perderia caso recusasse incorporar as emendas?
Bonduki -
Não.

Folha - Quando Mentor chegou com a lista de mudanças, o sr. não chegou a perguntar para ele a quem as mudanças beneficiariam?
Bonduki -
Não, porque é uma postura minha. Se eu fosse entrar numa discussão caso a caso, eu não teria a menor condição naquele momento. Primeiro porque era um método que eu acho errado. Na verdade, muitas mudanças são necessárias na cidade, mas tem o momento certo para fazer.

Folha - O sr. não quis saber nem se seriam algo prejudicial...
Bonduki -
Seria muito difícil saber naquele momento. Você teria de saber, um por um, quem são os proprietários daqueles lotes.

Folha - Mas o sr. fez uma seleção de mudanças, não fez? Não eram mais áreas do que as incluídas?
Bonduki -
Na verdade é o seguinte: eu falei que aquilo era muito e precisava ser reduzido. Aí foram escolhidas algumas. Eram mais de 30 inicialmente.

Folha - Quem escolheu, o Mentor?
Bonduki -
É. Ele disse: "Pelo menos as primeiras".

Folha - O sr. se lembra do que foi cortado?
Bonduki -
Não. Eu, na verdade, não queria olhar porque olhar significava eu começar a dar um juízo de mérito em uma situação difícil. Veja bem, o substitutivo é coletivo. Eu deixei claro nesse momento que não concordava. Não diria que concordo com 100% do plano. Concordo com 99%.


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