São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2000

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RIO
Sem antecedentes criminais, vítimas dizem que policiais chegaram atirando; para tenente, tropa foi recebida a bala por traficantes
PM ocupa favela e 7 moradores são feridos

Osvaldo Prado/Folha Imagem
A gorçonete Rita Cláudia Loiola Neto, 30, que levou dois tiros na perna direita durante ação da PM na favela Parque União


PEDRO DANTAS
DA SUCURSAL DO RIO

Uma operação da Polícia Militar contra traficantes na favela Parque União, no complexo de favelas da Maré (zona norte do Rio), terminou anteontem à noite com sete moradores feridos.
As vítimas não têm antecedentes criminais e acusam os policiais de despreparo e pânico na ação. "Estava na mercearia da minha família e a rua estava calma. Vi os policiais chegando, mas não pensei que eles iam começar a atirar sem motivo. Foi coisa de maluco", disse a garçonete Rita Cláudia Loiola Neto, 30, que levou dois tiros de raspão na perna direita.
A mesma versão conta a estudante Leilane Pereira Farias, 18, que tinha ido comprar quentinhas com o namorado e terminou com três balas na perna esquerda.
Cerca de 30 moradores que assistiam à partida entre Flamengo e River Plate em frente à única casa com TV a cabo na favela acusam os PMs de confundirem o grupo com traficantes.
Uma moradora que preferiu não se identificar disse, porém, que um homem armado assistia ao jogo. "Ele estava armado, mas não reagiu. Apenas fugiu ao ver os policiais", afirmou.
"Assistia ao jogo quando fui atingido no ombro de raspão. Eles confundiram o tumulto da torcida com outra coisa. Tudo durou no máximo cinco minutos", afirmou o frentista João Paulo de Souza Nascimento.
Entre os torcedores, o caso mais grave foi o de Wagner da Costa Santos, 20, que levou um tiro no tórax. Segundo o assessoria do Hospital Geral de Bonsucesso, todos os feridos foram liberados após o atendimento. Wagner foi liberado ontem. O caso que mais impressionou os médicos foi o de José Samuel dos Santos Júnior, 24, atingido no lado esquerdo da face e salvo por um dente que interrompeu a trajetória da bala.
A PM informou que recebeu, às 22h, uma denúncia anônima que garantia que os traficantes Celsinho da Vila Vintém, da facção criminosa Amigos dos Amigos, e Linho, do Terceiro Comando, preparavam uma invasão aos pontos de tráfico da favela dominados pelo Comando Vermelho.
Oito policiais do 22º batalhão foram deslocados para o local. Na versão da PM, os policiais teriam sido recebidos a tiros por três homens armados que se posicionaram atrás do grupo que assistia ao jogo de futebol, a apenas 15 metros de distância. Os moradores negam que tenha havido o tiroteio e afirmaram que os policiais teriam chegado atirando.
O tenente Paiva Alberto comandou a ação e disse que três homens começaram a atirar ao avistarem os PMs. "A prova é que esses ferimentos leves jamais seriam provocados por balas de fuzil que utilizamos na ação. Assim que foi possível, cessamos fogo para não ferir os moradores", afirmou.
Das 15 favelas do Complexo da Maré, em 12 o tráfico é dominado por "Linho", do Terceiro Comando. Nas outras, é dominado por "Gigante", preso em Bangu 1 e ligado ao Comando Vermelho.
Segundo o comandante do 22º Batalhão de Polícia Militar, coronel Mauro Figueiredo, não houve pânico entre os policiais. "Somos profissionais. Não acredito que eles tenham ficado transtornados nessa ocorrência com as últimas mortes de policiais no Rio", disse o coronel, que recolheu fuzis e armas particulares dos policiais e abriu IPM (Inquérito Policial Militar). Figueiredo declarou que 50 PMs permanecerão na favela, pois "a ameaça de invasão continua".



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