São Paulo, quinta-feira, 28 de setembro de 2000

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PASQUALE CIPRO NETO

O segredo das secretárias

A etimologia estuda as palavras, sua história e as possíveis mudanças de seu significado. Em suma, estuda a origem e a evolução histórica de uma palavra. E o que não falta é história.
Uma dessas histórias diz respeito a "forró". Durante muito tempo, acreditou-se que "forró" viesse de "for all". Dizia a lenda que determinada empresa inglesa construía uma obra no Nordeste. Nos dias de folga, organizavam-se duas festas. Uma para os executivos e outra para o povão, isto é, "for all" ("para todos"). De "for all" se teria evoluído para "forró".
Os estudiosos do assunto garantem que "forró" nada mais é do que a redução de "forrobodó" (de origem incerta), que, entre outros significados, tem o de "arrasta-pé", ou seja, "baile popular".
O caso de "salário" é bastante interessante. O sal já foi moeda corrente. "Salário" vem do latim "salariu" ("ração de sal").
Como se vê, muitas vezes o significado das palavras está atrelado a um fato histórico, social. O "músculo sartório" (longo e estreito, localizado na região anterior e externa de cada coxa) adquiriu o nome do latim "sartor", "sartoris" ("que conserta").
Em italiano, "sarto" nada mais é do que "alfaiate", "costureiro", profissional que faz e conserta roupas. O "sarto" costuma colocar a roupa sobre a coxa, sobre o músculo ao qual deu o nome. O nosso "alfaiate" vem do árabe, língua da qual provêm muitas de nossas palavras.
No próximo sábado, comemora-se o Dia das Secretárias. Parafraseando Bandeira ("O meu reino pelas três mulheres do sabonete Araxá!"), o meu pelas secretárias! Factótuns, não medem esforços para que tudo vá bem.
Nobre função a delas: manter segredo. Sim, pois a raiz de "secretária" é a mesma de "segredo", "secreto", "segredar", "segregar" etc. Ao pé da letra, "segredo" (que vem do latim "secretu") significa "separado". O que é secreto é posto de lado, escondido, ocultado.
Pois vou contar-lhes um segredo: tal qual Bandeira ("Se me perguntassem: Queres ser estrela? queres ser rei? queres uma ilha no Pacífico? um bangalô em Copacabana?/ Eu responderia: Não quero nada disso, tetrarca. Eu só quero as três mulheres do sabonete Araxá:/ O meu reino pelas três mulheres do sabonete Araxá!"), só quero as secretárias. Mas com uma condição: que aposentem definitivamente o gerúndio. Já pensou? "O que você vai estar querendo beber, amo?"; "Posso estar marcando uma reunião, chefe?". Nem em Pasárgada!

A atleta Cathy Freeman, vencedora dos 400 m nos Jogos Olímpicos, fez a imprensa empregar uma palavra pouco comum no dia-a-dia: "aborígine" (ou será "aborígene"?). Trata-se daquele que habita a região de que é originário. É o indígena, nativo, autóctone.
Talvez você tenha visto nos jornais as duas grafias. Não se assuste. As duas são corretas. Em alguns dicionários (o de Caldas Aulete, por exemplo), só se dá "aborígine". O "Aurélio" só dava "aborígine". Na última edição ("Novo Aurélio Século XXI"), encontram-se as duas formas. O velho "Morais" já registrava as duas. E o "Vocabulário Ortográfico" (da Academia), que tem força de lei, registra as duas. É isso.


Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
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