São Paulo, sábado, 28 de setembro de 2002

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VIOLÊNCIA

Chefe da Polícia Civil do Rio diz que havia evidências, no caso Tim Lopes, para indiciar dois homens ligados a Elias Maluco

Delegado acusa chefia de impor acusação

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

O delegado Sérgio Falante, responsável pelas apurações sobre o assassinato do jornalista da TV Globo Tim Lopes, disse que, "por recomendação da chefia de polícia", indiciou como responsáveis pelo crime dois homens que, para ele, não participaram do crime.
"O governo já tinha declarado que eles eram participantes, então a recomendação é "deixa para lá, vai como está, e a Justiça é que vai se pronunciar a respeito'", afirmou Falante à Folha.
Lopes fazia uma reportagem na favela Vila Cruzeiro (zona norte) quando, na noite de 2 de junho, foi capturado, torturado e morto, segundo a polícia, por traficantes comandados por Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco.
Titular da 22ª DP (Delegacia de Polícia) à época das investigações, Falante foi afastado das funções por causa do relatório final do inspetor Daniel Gomes, que afirmava que Lopes se colocara "muito perto do perigo, não vislumbrando a diferença da emoção para a razão". Gomes também foi afastado da função que exercia na 22ª.
Para Falante -até hoje afastado do trabalho policial-, Reinaldo Amaral de Jesus, conhecido como Cabê ou Kadê, e Fernando Satyro da Silva, o Frei, não participaram do crime. Após o indiciamento, eles foram denunciados pelo Ministério Público e estão sendo processados, junto com Elias Maluco e mais quatro homens. Dois acusados morreram.

Depoimento
Presos no dia 9 de junho, Cabê e Frei disseram que souberam do crime por um traficante. Descreveram o funcionamento do tráfico na região e detalharam como Lopes fora torturado e morto pelo grupo de Maluco.
"Eles não estavam presentes, sabem por ouvir dizer. Eles não confessam. Eu acho que eles não têm a ver com a execução", afirmou o delegado.
O chefe de Polícia Civil, Zaqueu Teixeira, disse que, de fato, deu orientação para que fossem indiciados todos contra os quais houvesse provas e que, por acompanhar o caso de perto, considerou haver, no contexto das investigações, evidências da participação de Cabê e Frei.
"A meu juízo, havia provas de que eles participaram. Tanto é que o Ministério Público denunciou e a Justiça recebeu a denúncia", afirmou Teixeira.
Segundo ele, Falante não se opôs aos dois indiciamentos. O chefe de polícia disse que, quando um delegado não concorda com uma orientação, pode se desligar do caso. Para Teixeira, Falante está reagindo ao afastamento.
A promotora Patrícia Glioche, uma das autoras da denúncia, ficou surpresa com as declarações de Falante. Segundo ela, a Promotoria denunciou Silva e Jesus por entender que há indícios da participação deles no assassinato.

Novas versões
Em juízo, Cabê, Frei e a testemunha de acusação Eduardo Gonçalves negaram declarações feitas durante o inquérito e disseram que foram obrigados a falar sob tortura. Outro acusado, Elizeu Felício de Souza, o Zeu, também negou em juízo a confissão feita durante o inquérito, mas não relatou tortura.
O delegado e o chefe de polícia estão de acordo num ponto: negar versões em juízo é uma estratégia de defesa. Zaqueu Teixeira afirmou que, se for informado pela Justiça de que houve tortura, mandará investigar.
"Quando esses vagabundos prestam depoimento, estão desprotegidos, porque não conversaram com advogado. O que eles falam na delegacia é a verdade. Quando vão depor em juízo estão instruídos por advogados e falam o que o advogado ensinou a falar", afirmou Falante.
A promotora declarou não se surpreender com o fato de acusados mudarem versões. Disse que o júri saberá avaliar a verdade de cada afirmação.


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