São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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CONFRONTO NO RIO

Moradores deixam o morro assustados

Carregando cadeiras, micro-ondas e até fogões, crianças e adultos deixam o Complexo do Alemão

Já na Vila Cruzeiro, que está sob ocupação da polícia desde quinta, moradores começam a retomar rotina

JANAINA LAGE
DO RIO
ROGÉRIO PAGNAN
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

"Deixa eu passar! Deixa eu passar! Não dá mais para ficar nesse inferno", disse uma mulher na faixa dos 40 anos, que não quis se identificar, carregando uma cadeira branca de sala de jantar e estofado laranja, no intervalo de um tiroteio.
Quase correndo, tentava driblar os carros de polícia e de imprensa parados na rua Itararé, que margeia o Complexo do Alemão. Ao lado, uma menina carregava um micro-ondas no meio da rua.
Dois rapazes na faixa dos 18 anos equilibravam às pressas um fogão. Não quiseram falar, disseram que não havia tempo a perder.
Desde a manhã, a cena se repetiu em várias ruas da favela da Grota: fila de pessoas saindo a pé, carregando móveis, eletrodomésticos ou apenas com sacolas e roupas na mão. De tarde, no intervalo de um intenso tiroteio uma nova leva de moradores desceu da favela.
Uma dona de casa de 32 anos saiu apressada da entrada principal da favela. Acompanhada de três filhas e da mãe, carregava em cada mão uma sacola plástica com as roupas da família. "Cresci aqui, nunca vi isso assim. Não me sinto segura para ficar", disse.
Ela pretende ficar na casa da irmã em Piabetá, na Baixada Fluminense. "Só volto daqui a uma semana", disse. Ela afirmou que deixou a casa fechada e torce para encontrar tudo de volta. "Não deu tempo de pegar nada."
A doméstica Vânia, 40, saiu junto com as duas netas, uma de sete e outra de três anos. "Moro aqui há 12 anos e estou com muito medo da invasão", disse. "Só volto quando isso acabar."

DO OUTRO LADO
No outro lado da serra da Misericórdia, onde fica a favela Vila Cruzeiro, ocupada pela polícia desde quinta-feira, as pessoas começaram a retomar suas rotinas.
As ruas e vielas da favela ficaram congestionadas pelo vai-vai de moradores, boa parte carregava sacolas plásticas nas mãos.
"Isso aqui está uma beleza. Tomara que fique como está. Livre. Estou bebendo faz dois dias para comemorar", disse um aposentado de 63 anos.
Uma dona de casa de 62 anos, evangélica, carregava sacos cheios de lixo doméstico. Por imposição do tráfico, os caminhões não sobem a favela para coleta e os moradores precisam descer até um depósito montado na saída do local. "Só espero que agora, se Deus quiser, o caminhão vá buscar o lixo na porta da minha casa como num bairro comum", disse.
Além da limpeza das ruas, a companhia de energia elétrica iniciou o restabelecimento da energia elétrica.
Grande parte dos moradores comemora a ocupação, mas teme que ela seja apenas temporária. "Eles [traficantes] voltam num veneno ainda maior. Vão atrás de quem ficou rindo e de quem não os ajudou", disse um vendedor de 19 anos.


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