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CONFRONTO NO RIO
Moradores deixam o morro assustados
Carregando cadeiras, micro-ondas e até fogões, crianças e adultos deixam o Complexo do Alemão
Já na Vila Cruzeiro, que está sob ocupação da polícia desde quinta, moradores começam
a retomar rotina
JANAINA LAGE
DO RIO
ROGÉRIO PAGNAN
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
"Deixa eu passar! Deixa eu
passar! Não dá mais para ficar nesse inferno", disse uma
mulher na faixa dos 40 anos,
que não quis se identificar,
carregando uma cadeira
branca de sala de jantar e estofado laranja, no intervalo
de um tiroteio.
Quase correndo, tentava
driblar os carros de polícia e
de imprensa parados na rua
Itararé, que margeia o Complexo do Alemão. Ao lado,
uma menina carregava um
micro-ondas no meio da rua.
Dois rapazes na faixa dos
18 anos equilibravam às
pressas um fogão. Não quiseram falar, disseram que não
havia tempo a perder.
Desde a manhã, a cena se
repetiu em várias ruas da favela da Grota: fila de pessoas
saindo a pé, carregando móveis, eletrodomésticos ou
apenas com sacolas e roupas
na mão. De tarde, no intervalo de um intenso tiroteio uma
nova leva de moradores desceu da favela.
Uma dona de casa de 32
anos saiu apressada da entrada principal da favela.
Acompanhada de três filhas
e da mãe, carregava em cada
mão uma sacola plástica com
as roupas da família. "Cresci
aqui, nunca vi isso assim.
Não me sinto segura para ficar", disse.
Ela pretende ficar na casa
da irmã em Piabetá, na Baixada Fluminense. "Só volto
daqui a uma semana", disse.
Ela afirmou que deixou a casa fechada e torce para encontrar tudo de volta. "Não
deu tempo de pegar nada."
A doméstica Vânia, 40,
saiu junto com as duas netas,
uma de sete e outra de três
anos. "Moro aqui há 12 anos e
estou com muito medo da invasão", disse. "Só volto
quando isso acabar."
DO OUTRO LADO
No outro lado da serra da
Misericórdia, onde fica a favela Vila Cruzeiro, ocupada
pela polícia desde quinta-feira, as pessoas começaram a
retomar suas rotinas.
As ruas e vielas da favela
ficaram congestionadas pelo
vai-vai de moradores, boa
parte carregava sacolas plásticas nas mãos.
"Isso aqui está uma beleza. Tomara que fique como
está. Livre. Estou bebendo
faz dois dias para comemorar", disse um aposentado de
63 anos.
Uma dona de casa de 62
anos, evangélica, carregava
sacos cheios de lixo doméstico. Por imposição do tráfico,
os caminhões não sobem a
favela para coleta e os moradores precisam descer até
um depósito montado na saída do local. "Só espero que
agora, se Deus quiser, o caminhão vá buscar o lixo na
porta da minha casa como
num bairro comum", disse.
Além da limpeza das ruas,
a companhia de energia elétrica iniciou o restabelecimento da energia elétrica.
Grande parte dos moradores comemora a ocupação,
mas teme que ela seja apenas
temporária. "Eles [traficantes] voltam num veneno ainda maior. Vão atrás de quem
ficou rindo e de quem não os
ajudou", disse um vendedor
de 19 anos.
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