São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004

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Volta ao país traz misto de alegria e desânimo

DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

Ao chegarem ontem a Belo Horizonte, os primeiros brasileiros deportados dos EUA demonstravam, ao mesmo tempo, alegria por reencontrarem a família e desânimo pelo fim de um sonho.
Para o representante comercial Renato Queiroz Bispo, 39, paulistano do bairro de Itaquera (zona leste), a aventura de tentar ganhar a vida nos Estados Unidos não se repetirá. "Não volto nunca mais para lá."
Na tentativa de cruzar a fronteira pela cidade mexicana de Cananéia, o representante comercial relatou ter presenciado estupros praticados por "coiotes" (traficantes de imigrantes).
Ao chegar à cadeia de Tucson, no Arizona, ele disse ter passado três dias sem tomar banho. Reclamou também da alimentação e do frio. Afirmou que perdeu US$ 2.000 na empreitada, entre passagens e comida. No total, foram 25 dias preso.
O motorista e cozinheiro Antônio Carlos da Costa, 38, morador de Belo Horizonte, foi recebido, na volta dos EUA, pela mãe, pela mulher e por seus dois filhos, de seis e quatro anos.
Disse ter tentado sozinho a travessia para os Estados Unidos, sem intermediários. Vendeu um restaurante de sua propriedade para juntar dinheiro. Foi detido três dias após deixar o Brasil, em dezembro. "O desemprego aqui [no Brasil] é muito grande. Não há outra saída."
Costa afirmou que pode tentar entrar novamente nos EUA, da próxima vez com a família. "O risco compensa. Vou descansar uns dias, juntar dinheiro e tentar ir embora de novo."
Dos 277 repatriados, 70% são de Minas Gerais, informou o senador Hélio Costa (PMDB-MG). Os outros 30% são de Mato Grosso do Sul, Tocantins, São Paulo, Espírito Santo, Pernambuco, Pará, Maranhão, Bahia, Mato Grosso, Santa Catarina, Rondônia, Distrito Federal e Goiás.
Até o final da tarde de ontem, a auxiliar de escritório Raquel Velasco, 24, ainda esperava, com o filho de dois anos no colo, a liberação do marido, o instalador de películas de carro Gilmar Lúcio da Cruz, 27, de Resplendor (MG). "No início, ele ficou revoltado com a prisão, porque tentava só trabalhar honestamente", disse.
A desempregada Neuza dos Santos, 36, de Ribeirão das Neves (região metropolitana de Belo Horizonte), lamentava a dívida de R$ 10 mil contraída pelo marido, Sebastião Pontes Gomes, para tentar ingressar nos EUA. "Vamos ver o que vai acontecer agora", afirmou. Gomes não havia sido liberado até o final da tarde.
Nenhum dos deportados contatados pela Agência Folha relatou casos de agressões nas cadeias norte-americanas. Grande parte reclamou da alimentação -açucarada ou apimentada demais- e disse ter tentado a aventura por incentivo de parentes que já vivem naquele país.


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