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MOACYR SCLIAR
A mais antiga das profissões, o mais novo dos negócios
Bordel australiano planeja lançar
ações em Bolsa de Valores
Folha Online Mundo, 22.jul.2002
A situação na Bolsa de
Valores era má -tão má,
na verdade, que a palavra crash,
com todas as suas sombrias conotações, começava a ser murmurada nos círculos financeiros. Está
na hora de rezar, dizia um grande especulador, e, de fato, já havia
muita gente fazendo suas orações.
E então -por efeito das preces
ou por qualquer outra razão- a
coisa aconteceu. E da forma mais
inesperada.
Um grande bordel (na verdade,
uma rede de bordéis, incluindo
estabelecimentos operando sob
franquia) resolveu lançar ações
na Bolsa. A iniciativa foi recebida
com mal-estar em alguns círculos
mais moralistas; outros, no entanto, achavam aquilo perfeitamente normal: a profissão mais
antiga do mundo estava, afinal,
se revelando também como negócio -o mais novo dos negócios. E
um negócio extremamente ousado, inovador mesmo. O balanço
da empresa não era apresentado
como um maçudo relatório, mas
sim sob a forma de atraente publicação, ilustrada com fotos de
mulheres nuas -as mulheres que
trabalhavam nos numerosos bordéis da companhia. Pelo relatório
também se descobria que o negócio incluía a venda de numerosos
produtos, entre eles uma camisinha equipada com um chip que,
durante o ato sexual, emitia uma
linda melodia de amor.
O resultado foi, para dizer o mínimo, surpreendente.
Depois do espanto inicial, os investidores começaram a se interessar pelos papéis, que de imediato subiram de preço, a princípio lentamente, e logo em ritmo
febril. De nada adiantou a advertência de Alan Greenspan com a
metáfora do preservativo que se
transforma em bolha; as ações
eram disputadas freneticamente.
Outras companhias entraram no
negócio. Algumas sugeriam até a
criação de uma Bolsa especializada no assunto, uma espécie de
Nasdaq do sexo. Economistas,
perplexos, não sabiam como se
posicionar nessa nova situação.
Como disse um deles, intrigado:
"Pelo jeito, só o sexo para fazer
subir a Bolsa". Falava-se também
no "Viagra econômico".
"A economia erotizada" foi a
manchete de um grande jornal financeiro, e, de fato, o comércio sexual transformou-se no carro-chefe da atividade econômica.
Não era apenas a produção de camisinhas; sex shops surgiam em
toda a parte, filmes eróticos vendiam como nunca. E então,
quando o mercado financeiro celebrava a superação da crise veio
a debacle.
Um jornalista abelhudo resolveu investigar os bastidores da
grande rede de bordéis, incluindo
o desempenho financeiro. E o que
então veio a público foi uma monumental fraude, uma fraude capaz de enfiar todas as similares
no bolso.
Os balanços da grande empresa
eram grosseiramente maquiados.
Os seus rendimentos tinham sido
inflados até o absurdo. Até as fotos das mulheres eram falsas.
Muitas delas tinham sido retocadas eletronicamente -o conhecido truque de aumentar o bumbum. Outras tinham sido compradas de magazines pornográficos. Os bordéis, apresentados como estabelecimentos dotados de
luxo e de conforto eram exatamente o contrário disso. Um deles
funcionava em um velho trailer;
outro, no meio de uma favela.
A notícia caiu como um raio sobre a Bolsa de Valores. As ações
da rede de bordéis despencaram
e, junto com elas, todas as outras.
O pânico tomou conta do negócio
e de novo começou a se falar em
crash.
Agora, uma nova empresa está
lançando suas ações. Ela também
opera no ramo do comércio sexual, mas alega que seu produto é
garantido: bonecas infláveis. Prazer a qualquer momento e da maneira mais prática possível. Certamente as ações subirão. Mas o
jornalista abelhudo já está em
campo. O sonho dele é descobrir
furos nas bonecas -se possível,
remendados com esparadrapo.
O escritor Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de
ficção baseado em reportagens publicadas no jornal.
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