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O dia em que a neurociência vai às compras
SUZANA HERCULANO-HOUZEL
ESPECIAL PARA A FOLHA
Como o cérebro se comporta em uma liquidação? O
que nos faz perder o controle
diante de ofertas "imperdíveis" de produtos, bem, não
tão necessários assim?
Decisões de comprar ou
não comprar envolvem considerações complexas sobre
o que está disponível, seu
custo, a necessidade real de
obter o produto e as preferências pessoais do consumidor. Uma teoria supõe
que essas decisões refletem
simplesmente a antecipação
de ganhos com a compra em
questão. A hipótese que ganha o apoio da neurociência,
no entanto, é outra: decidir
comprar depende de uma
competição entre os circuitos cerebrais que representam o prazer imediato de adquirir um objeto e os que representam a dor imediata de
pagar por ele. Quem falar
mais alto no cérebro -o prazer de comprar ou a dor de
pagar- conquista a decisão.
Teoria
A teoria do toma-lá-dá-cá
das decisões econômicas é
apoiada por evidências de
que circuitos cerebrais diferentes cuidam da antecipação de custos e benefícios e
são ativados em momentos
específicos de uma decisão
de compra.
Representando o prazer
antecipado do ganho material temos o núcleo acumbente, cerne do sistema de
recompensa cerebral, cuja
ativação é motivadora, depende de nossas preferências pessoais e prediz o que
será comprado. Representando as perdas financeiras
antecipadas, temos o córtex
da ínsula, responsável por
emoções negativas como o
desgosto e a ansiedade, cuja
ativação em resposta ao preço do objeto em questão serve como um freio que mantém a carteira fechada. Entre
os dois, e associado à decisão
de compra, temos a porção
medial do córtex pré-frontal,
ativado em resposta a produtos cujo preço é menor do
que o preço-limite do consumidor -como em uma espécie de liquidação.
"Compra, compra"
O cérebro humano é, portanto, um prato feito para a
liquidação da sua loja favorita: diante de preços reduzidos, o núcleo acumbente diz
"eu gosto disso", o córtex
pré-frontal medial diz "puxa,
custa menos do que eu aceitaria pagar normalmente", a
ínsula não se opõe e outra região do pré-frontal, que tenta evitar arrependimentos,
ainda diz "compra, compra!".
Some-se a isso estratégias
de marketing que minimizam a dor do pagamento, reduzindo o custo aparente em
parcelas pequenas, um pedaço de plástico que deixa o dinheiro na carteira e tem-se o
drama do consumidor que se
descobre endividado ao chegar em casa. Para a ele, a neurociência tem uma dica: deixar o cartão em casa e levar apenas dinheiro quando for
à liquidação. Com o risco,
claro, de perder aquela oportunidade incrível...
Suzana Herculano-Houzel é neurocientista,
professora da UFRJ e autora dos livros "O
Cérebro Nosso de Cada Dia" e "Sexo, Drogas, Rock'n'Roll & Chocolate" (ed. Vieira &
Lent)
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