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Promoções descontrolam consumistas fanáticas por liquidação
Discussões entre os clientes, disputas pela melhor peça e contas que ficam no vermelho são alguns dos saldos da temporada de descontos em São Paulo
ADRIANA KÜCHLER
CAMILA YAHN
DA REVISTA DA FOLHA
"Quase enlouqueci. No meio
de tantos sapatos pela metade
do preço, não sabia mais quais
havia experimentado nem dos
que mais gostava. Levei todos."
O relato, de uma "shopaholic"
que não quis se identificar,
mostra a urgência -e o arrependimento- que substituem
a razão nesta época do ano,
quando anúncios de desconto
forram vitrines da cidade.
"Nem preciso dizer que, dos
oito pares que levei, apenas
dois foram bem aproveitados."
Basta as lojas anunciarem 20%,
30% ou 70% para esses descontroles se intensificarem. Discussões, disputas pela melhor
peça e contas no vermelho são
alguns dos saldos da temporada
de liquidações.
Ana Paula Albanez, 22, gerente de marketing da marca
Reinaldo Lourenço, é daquelas
que já presenciou cabeças -e
carteiras- serem perdidas. "Já
vi de tudo, especialmente nos
bazares", diz, referindo-se à liquidação anual que a grife faz
com até 90% de desconto. "No
meio da bagunça, uma cliente
pega a roupa da outra e dá
aquela confusão. Nessa hora eu
entro, que é para não rolar barraco." Numa das liquidações
recentes, ela conta que uma
cliente chegou a gastar R$ 12
mil de uma só vez.
Os preços praticados por essas lojas nesta época são mesmo sedutores se comparados
aos valores de lançamento. Numa liquidação de Reinaldo
Lourenço, uma calça sai por R$
400, em vez dos R$ 800 originais. Na loja Theodora, em Higienópolis, o hit são as caixas tipo saldão, com produtos que
vão de R$ 10 a R$ 35.
Um dos efeitos (colaterais)
mais comuns da queda de preços é a euforia. Isso explica porque em liquidações do tipo
"50% off" é algo normal se deparar com mulheres andando
peladas, como se estivessem
em casa, com roupas nas mãos.
A situação gera confusões. A
publicitária Ellen Kanamori,
23, quase arranjou uma briga
por um par de sapatos. Ao provar um pé do modelo "dos sonhos", Ellen decidiu que iria
comprá-lo. Só que o outro pé já
estava calçado em uma cliente
e era o único disponível. "Eu
não tirei o meu nem ela o dela.
Ficou aquela troca de olhares
antipática, até que eu resolvi
ceder para não ter problemas."
Gato por lebre
A euforia coletiva não é resultado apenas da perigosa
combinação de fashionistas
com produtos baratos. As lojas,
por sua vez, influenciam e incentivam o comportamento
voraz dos consumidores.
Vitrines que parecem gritar a
palavra "liquidação" causam
uma idéia de urgência, explica
Heloísa Omine, 50, professora
de comunicação no ponto-de-venda da ESPM. "Apresentando o conceito de que aquilo vai
acabar, motivam o cliente", diz.
Resultado: para não perder a
chance, muitos acabam trocando gato por lebre e compram
por uma "pechincha" sobras de
coleções com cores e estilos
que podem estar "superout".
Na alegria e na tristeza
Essa "desculpa" para comprar é chamada de "compulsive
buying" (compra compulsiva),
termo nascido nos EUA que designa a urgência descontrolada
em comprar. "Na hora, a compra é uma atividade prazerosa,
mas depois envolve culpa e problemas financeiros. A pessoa
pega o que não precisa, não usa
ou perde o interesse logo depois", explica Lorrin Koran, autor de estudos sobre compradores compulsivos e professor de psiquiatria na Universidade
Stanford, na Califórnia.
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