São Paulo, quinta-feira, 30 de maio de 2002

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EDUCAÇÃO

Alunos da 1ª à 8ª série da rede municipal não conseguem ler enunciados de questões; município muda sistema de ensino

Escolas de Santos têm 1.493 analfabetos

Moacyr Lopes Junior - Folha Imagem
Anderson, 7 (nome fictício), aluno da primeira série, mostra palavras que escreveu com auxílio da mãe, que soletrou-as para ele


FAUSTO SIQUEIRA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SANTOS

Pelo menos 4% dos 36 mil estudantes da 1ª à 8ª série da rede municipal de Santos (SP) são analfabetos, segundo classificação da Secretaria da Educação, resultante de um provão aplicado pela prefeitura da cidade, a maior do litoral paulista.
Esses 1.493 alunos entregaram em branco as provas de português, matemática, ciências, história, geografia e inglês porque não conseguiram ler o enunciado das questões, segundo a secretária municipal Jossélia Fontoura.
O exame, realizado no mês passado, foi o primeiro dos quatro provões bimestrais previstos no sistema de progressão avaliada adotado neste ano pela prefeitura. O sistema reinstituiu a nota e a frequência mínimas como requisitos para a aprovação dos alunos, em substituição à progressão continuada, que vigorou na rede municipal entre 1998 e 2001.
Adotada nas escolas estaduais no governo Mário Covas (PSDB), a progressão continuada estabeleceu ciclos de quatro anos, dentro dos quais o estudante não repete, ainda que não domine o conteúdo das disciplinas.
Com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que permite as prefeituras definirem o modelo pedagógico a ser aplicado no ensino municipal, a Prefeitura de Santos (gerida pelo PPB) decidiu abolir a progressão continuada, qualificada como método de "promoção automática" dos alunos.
Por isso, a maioria não conseguiu obter no provão a nota mínima (6) estipulada pela secretaria. Os alunos com pior desempenho foram os da 6ª série, na qual 93,4% tiveram notas inferiores a 6. O melhor aproveitamento ocorreu na 1ª série -20,3% não alcançaram a nota mínima. No censo escolar 2001, divulgado na semana passada pelo Ministério da Educação, o índice de reprovados, em 2001, em todo o país, no ensino fundamental foi 10,8%.
"Já tínhamos uma visão do problema, mas não imaginávamos que fosse tão alarmante", disse Jossélia Fontoura, que anunciou um "megamutirão" para recuperar os analfabetos e os alunos com "defasagem de conhecimento".
Para ela, as notas no provão refletiram o "desastre" da progressão continuada. "Falta hábito de estudo. Os alunos não estavam acostumados à avaliação, não havia cobrança de nota. Com isso, a família se distanciou, e a criança passou a chegar à série seguinte sem o pré-requisito da anterior."
Integrante do Conselho Municipal de Educação, Maria Luiza Carballo Lopes disse que os resultados só não foram piores devido à "boa vontade" de professores.
"Alguns professores acompanharam alunos linha a linha, exercício por exercício. Se a prova estivesse só na mão da criança, seria zero para quase todos. A ajuda do professor não deixou que o resultado fosse ainda mais caótico", afirmou a conselheira, que trabalhou como fiscal nas salas de aula durante o provão.
A presidente da Associação de Pais e Amigos de Escolas Públicas da Baixada Santista, Maria Ferreira Tavares, disse que a entidade reunir pais para discutir a questão. "Estou apavorada. Os pais terão de ser parceiros porque, sozinha, a instituição escola não vai conseguir reverter isso."
O prefeito Beto Mansur (PPB) afirmou que está descartado o retorno à progressão continuada, mesmo se houver um índice elevado de repetência. Caso o ano letivo terminasse hoje, a maior parte dos alunos da rede municipal estaria reprovada. "Até dezembro, essa molecada vai ter de rachar de estudar para passar de ano", afirmou o pepebista.



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