São Paulo, quarta-feira, 30 de agosto de 2000


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VIOLÊNCIA
Protesto contra repressão policial reuniu cerca de 300 pessoas; segundo organizadores, houve intimidação oficial
Fracassa manifestação de favelas no Rio

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Morador de favela cobre o rosto para evitar ser filmado pela PM


FERNANDA DA ESCÓSSIA
SERGIO TORRES

DA SUCURSAL DO RIO

As ações de intimidação promovidas na última semana pelo governo do Estado conseguiram provocar o fracasso do ato da FLP (Frente de Luta Popular), realizado ontem no centro do Rio como um Dia de Luta do Povo contra a Violência.
Entre os 300 manifestantes -320, pelos cálculos da Polícia Militar-, havia apenas cerca de cem moradores de favela, quase todos vindos do conjunto Bancários, na Ilha do Governador (zona norte). Os demais eram integrantes de movimentos organizados. Eram esperadas 2.000 pessoas.
O secretário da Segurança, Josias Quintal, definiu o evento como um "fiasco", em nota oficial. "Essa manifestação não foi legítima, pois não contou com a aprovação dos parentes dos mortos na chacina nem das verdadeiras lideranças comunitárias."
O ato foi anunciado na semana passada em protesto contra a violência policial e em memória dos sete anos da chacina de Vigário Geral. O governador Anthony Garotinho (PDT) determinou então que todas as manifestações fossem filmadas, alegando que elas estariam sendo incitadas pelo tráfico de drogas. Foram abertos inquéritos para apurar a possível ligação de líderes comunitários com traficantes.
A pequena adesão das comunidades ao ato de ontem teria resultado, na avaliação dos próprios organizadores, do anúncio de que tudo seria filmado pela PM -o que de fato aconteceu. Muitos manifestantes cobriram o rosto.
A PM acompanhou tudo com 60 homens na Candelária e mais 140 espalhados pelo centro da cidade. No meio da tarde, ainda havia mais PMs que manifestantes.
"O fato de haver pouca gente das comunidades não diminui o ato, os movimentos sociais também são do povo. Mas eu gostaria de saber por que o governo não filma as manifestações dos ricos. Quero saber se filmar manifestação é tarefa da PM", questionou André Fernandes, 29, coordenador do movimento Favelania e dirigente da FLP.
Segundo ele, os moradores de favela faltaram porque temeram ser identificados pelos PMs que trabalham nas comunidades. Ficou clara, porém, a dificuldade da FLP para mobilizar as favelas.
Além dos moradores da Ilha do Governador, também havia representantes do morro da Mineira e da favela de Acari.
Dos integrantes de movimentos organizados, havia 65 sem-teto trazidos pelo MTST (Movimento dos Sem Teto), além de membros do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), universitários, padres, pastores evangélicos, militantes de partidos de esquerda, funkeiros, sindicalistas da CUT (Central Única dos trabalhadores) e líderes comunitários.
Também estavam representados grupos tão diversos como o Movimento Anarco-Punk, o Movimento Negro Unificado e o Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes.
Entre os participantes, havia desde gente que não sabia muito bem do que se tratava "a tal passeata" -como a sem-teto Priscila Oliveira, 25- até pessoas indignadas com a violência policial. "Não dá mais para suportar a polícia invadindo a nossa casa. Basta de morrer gente", afirmou a doméstica Renata Manhães, 22.
O presidente da Associação dos Moradores do Jacarezinho, Rumba Gabriel, faltou ao evento depois que a polícia ameaçou investigá-lo por incitação ao crime. Acabou sendo chamado de "soldado covarde" (veja texto nesta página).
A manifestação foi pacífica, com palavras de ordem, faixas e músicas puxadas por funkeiros e integrantes do movimento hip hop. Não houve incidentes. No final da tarde, os manifestantes saíram em passeata rumo à Central do Brasil.


Colaborou Pedro Dantas, da Sucursal do Rio


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