São Paulo, quarta-feira, 30 de outubro de 2002

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INFÂNCIA

Testemunhas que prestaram depoimento sobre o caso teriam sido espancadas por monitores, segundo o Ministério Público

Promotoria apura abuso sexual na Febem

ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

Promotores da Infância e Juventude de São Paulo investigam denúncia de abuso sexual e casos de tortura contra internos da unidade 31 da Febem de Franco da Rocha, na Grande São Paulo.
Segundo o Ministério Público, é a primeira vez que se apura um caso em que um funcionário da entidade é acusado de abusar sexualmente de adolescente.
Os dois crimes envolvem os mesmos personagens: a vítima do suposto abuso e as testemunhas, que, depois de ouvidas pela Promotoria, teriam apanhado de monitores de Franco da Rocha ao retornar do fórum para a unidade.
Os seis adolescentes envolvidos nessas denúncias passaram ontem à tarde por exame médico com legista, na capital. Ao menos três tinham marcas recentes de espancamento, segundo a perícia, e um quarto precisará passar por uma bateria de exames por causa das pancadas -chutes, diz ele- que recebeu no órgão genital. O rapaz tem dificuldade para andar.
Não é o primeiro incidente de violência dentro da Febem de Franco da Rocha. Os promotores da Infância e Juventude de Capital -Wilson Tafner, Sueli Riviera e Ebenezer Soares- investigam desde setembro uma sessão coletiva de espancamento na mesma unidade, em que um grupo de 30 funcionários teria espancado mais de 40 internos.
Um dos garotos agredidos na época, conforme perícia médica, estava com o braço fraturado, resultado de uma agressão que disse ter sofrido em julho deste ano.

Segredo
O suposto abuso sexual, caracterizado legalmente como atentado violento ao pudor, teria ocorrido durante os jogos da Copa do Mundo, em julho passado, na ala "F", onde há 45 garotos distribuídos em quatro celas. Foi mantido em segredo desde então.
O interno F., 18, disse em depoimento que precisou levantar-se da cama, de madrugada, para ir ao banheiro -dentro da cela.
Um funcionário, descrito pelas testemunhas como um dos mais violentos, teria visto o rapaz acordado quando passava no corredor carregando uma lanterna.
Esse monitor teria chamado o adolescente e batido a cabeça dele várias vezes contra a grade.
Outros dois internos disseram ter presenciado a agressão e visto que o monitor obrigou F. a fazer sexo oral.
"Não contei o que aconteceu para a minha família porque estava com vergonha", afirmou F. à Folha.

Denúncia
No último dia 15, porém, o adolescente aproveitou uma visita dos promotores à unidade para fazer a denúncia de abuso.
Em 24 de outubro, quinta-feira passada, F. e um outro interno foram de Franco da Rocha para a capital prestar depoimento na Vara da Infância e Juventude.
"Quando a gente voltou, à noite, eles pegaram a gente na triagem [espécie de cela isolada]", afirmou K, 19, que teve ferimentos no órgão genital.
No dia seguinte, quando outras duas testemunhas foram depor sobre o suposto abuso, houve uma segunda sessão de espancamento na ala "F", afirmaram os adolescentes à promotoria.
A Promotoria tenta agora identificar os funcionários envolvidos nas agressões. Há pelo menos seis apelidos de monitores nos depoimentos que eles prestaram.
Segundo o promotor Wilson Tafner, os adolescentes disseram ter sido obrigados a passar por banhos gelados e a usar pomadas para tratar as manchas do corpo, em uma tentativa de esconder o que teria havido na unidade.
Há cerca de 60 procedimentos de investigação hoje na Promotoria da Infância e Juventude da capital por causa de denúncias de agressões nas unidades da Febem de Franco da Rocha.

Identidades
Os nomes dos internos agredidos não foram revelados por questão de segurança, a pedido do Ministério Público. Os apelidos dos monitores investigados por agressão também estão sendo mantidos em sigilo para não atrapalhar a investigação.


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