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16 ANOS DEPOIS
Costa Freire foi detido em 2004, acusado de tráfico de drogas; os outros sete continuam soltos em seus países
Só brasileiro está preso, mas por tráfico
DO ENVIADO AO CANADÁ
A cada um dos dez seqüestradores de Abilio Diniz cabia uma
tarefa muito bem definida, como
numa unidade militar, ou de
acordo com as regras da célula
que o grupo de fato era. Ao brasileiro Raimundo Rosélio Costa
Freire, então com 24 anos, ficou a
interação com o empresário.
Era com ele, e só com ele, que
Diniz podia falar durante os seis
dias em que sobreviveu no buraco
cavado sob o chão da cozinha e
transformado em cela no sobrado
número 59 da praça Hachiro Miyazaki, no bairro paulistano do
Jabaquara, na zona sul da cidade.
(O imóvel, aliás, foi comprado
três meses depois do seqüestro
por um senhor, que preferiu se
manter anônimo nesses anos todos e morreu três meses atrás, segundo os ex-vizinhos; seus herdeiros decidem agora o que fazer
com a casa, que está vazia.)
Foi Raimundo Rosélio Costa
Freire, também, o último a ser
transferido do Carandiru, em São
Paulo, para seu Ceará natal. E o
último a ser libertado, em 1999,
depois da "operação dominó" jurídica que tomou o caso com o retorno do casal Christine Lamont e
David Spencer para o Canadá.
Pois o brasileiro é o único dos
dez que está na cadeia. De volta.
Espera julgamento na unidade 2
do Instituto Penal Paulo Oliveira,
segundo informou à Folha a secretaria de Comunicação Social
da Polícia Federal daquele Estado.
A acusação não tem a ver com o
crime de seqüestro, de que foi
considerado culpado e pelo qual
ainda estava em liberdade condicional. Agora, é tráfico de drogas.
De acordo com a Delegacia de Repressão aos Entorpecentes (DRE)
local, Costa Freire foi preso em
flagrante em setembro de 2004,
com cerca de 10 kg de cocaína, 13
kg de maconha e um rifle.
Professor de história, o brasileiro estava com outro professor, José Helton Cunha, num sítio na região metropolitana de Fortaleza.
Costa Freire negou saber da presença de drogas ali e disse que estava na propriedade do amigo para terminarem uma monografia.
Biografia
Ligado nos anos 80 a movimentos da extrema esquerda latino-americana, o cearense de Juazeiro
do Norte militou no Partido dos
Trabalhadores depois de solto,
formou-se em história e lançou
um livro com seu trabalho de conclusão de curso, "Pão de Fel - Das
Utopias Guerrilheiras ao Seqüestro de Abilio Diniz" (Premius,
1997), de título auto-explicativo.
Se for condenado, será vítima
de uma ironia legislativa. Muito
por conta da repercussão pública
do seqüestro de que Costa Freire
participou, o Congresso Nacional
aprovou lei em 1990 que fez da
prática um "crime hediondo"
-assim como já ocorria com o
tráfico de drogas.
Dos outros sete, todos vindos de
organizações guerrilheiras como
as Forças Populares de Libertação
de El Salvador (FPL), integrante
da Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional (FFMNL), e o
braço chileno do Movimento de
Esquerda Revolucionária (MIR),
todos estão ligados de uma maneira ou de outra a movimentos
sociais -agora, dentro da lei.
O ex-líder, o argentino Humberto Paz, vive em La Tablada, um
bairro industrial do município de
La Matanza, no subúrbio de Buenos Aires, onde se "dedica às artes
plásticas", segundo um amigo
que prefere não ser identificado, e
trabalha em obras sociais com o
irmão, Horácio, parceiro de 1989.
Já o "grupo chileno", como
eram chamados os outros cinco,
se manteve coeso até pouco tempo atrás. Maria Emilia Marchi, 53,
que trabalha como fiscal de estradas do Ministério de Obras Públicas, em Santiago, separou-se há
quatro meses de Ulisses Galardo
Acevedo, outro participante, que
agora estuda sociologia.
Isso dividiu um pouco a turma,
formada ainda por Pedro Lembach, hoje trabalhando numa gráfica também na capital chilena;
Héctor Ramón Collante Tápia,
pedreiro como o pai numa cidadezinha do interior do Chile; e
Sérgio Olivares, que abriu um armazém com a mãe e o irmão na
periferia de Santiago.
(SÉRGIO DÁVILA)
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