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SP 450
"A Banda" e "Disparada" polarizaram disputa que simbolizou a era dos festivais de música popular brasileira em São Paulo
EU ESTAVA LÁ - ZUZA HOMEM DE MELLO
Jornalista, 70
Acordo evitou polêmica no mais famoso festival
KIYOMORI MORI
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Caetano Veloso ficou reclamando do
"injusto" quinto lugar de Gilberto Gil;
Roberto Carlos, derrotado, escapou discretamente dos jornalistas; Chico Buarque foi para a casa
dos pais comemorar;
Jair Rodrigues preferiu beber com os
amigos.
Naquela noite chuvosa de 10 de setembro de 1966, em que
Gil não sonhava ser
ministro, Roberto
Carlos ainda não era
o "Rei", Chico era um
quase anônimo e Jair
só cantava samba,
chegava ao fim o 2º
Festival da Música
Popular Brasileira.
"Esse dia foi o marco divisor da era dos
festivais de música
popular brasileira",
afirma o jornalista
Zuza Homem de Mello, 70, que na época
era técnico de som da
TV Record e que acompanhou de
perto os bastidores da disputa.
Das 2.635 canções inscritas,
apenas 12 haviam sido selecionadas para a final. "Todo mundo tinha um palpite: taxistas, imprensa, estudantes e até mesmo os
funcionários da Record faziam
"bolões" para apostar quem ganharia a tão esperada decisão",
lembra Zuza. "O clima era de final
de campeonato de futebol, as famílias e vizinhos se reuniam na
frente dos poucos televisores da
época para assistir às eliminatórias e discutir quais eram as melhores", conta.
Mas a disputa já estava polarizada. "Disparada", de Geraldo Vandré e Théo de Barros, cantada por
Jair Rodrigues, e "A Banda", de
Chico Buarque, interpretada por
Nara Leão, eram as grandes favoritas -e viriam a dividir um
"conveniente" primeiro lugar.
"As duas canções contavam
com torcidas organizadas -era a
primeira vez que isso acontecia
em um festival de canção-, e havia muita tensão para saber quem
levaria o prêmio", diz Zuza.
Nos bares da galeria Metrópole,
na avenida São Luiz,
os compositores e
maiores nomes da
música brasileira se
encontravam para
discutir o festival.
"Era um microcosmo do que seria a
platéia do teatro da
Record", explica Zuza. "Lá era possível
beber uma cerveja
no balcão com Gil,
Toquinho e Geraldo
Vandré e discutir o
andamento das eliminatórias, que duraram dois meses.
Dava para sentir o favoritismo de "A Banda" e "Disparada"."
Os cerca de 700 ingressos para assistir
à final, nos estúdios
da Record na rua da
Consolação, haviam
se esgotado rapidamente e se tornaram
peça cobiçada nas
mãos de cambistas.
Cinemas e teatros
cancelaram as sessões daquele dia porque acreditavam que
não haveria público
interessado. Até
mesmo o ex-governador Carvalho Pinto foi assistir à decisão ao
vivo. "Em São Paulo, todo mundo
estava envolvido e curioso para
saber quem ganharia", diz Zuza.
Segundo o jornalista e crítico,
autor de obras de referência da
música popular brasileira, os jurados haviam escolhido "A Banda" por sete votos a cinco. "Mas
Chico avisou, nos bastidores, que,
se ganhasse, não iria receber o
prêmio. Então os jurados e o diretor da Record Paulinho Machado
de Carvalho decidiram alterar o
resultado para evitar uma polêmica", afirma Zuza, que recebeu a
missão de guardar o envelope
com o verdadeiro resultado final.
"O Paulinho pediu para eu manter o envelope em um lugar seguro. Coloquei-o no cofre da minha
mãe, que acabou perdendo."
Zuza manteve o segredo até o
ano passado, quando publicou
em seu livro "A Era dos Festivais"
(editora 34) o resultado escondido no envelope. "Achei que era a
hora de as pessoas saberem a verdade", conta ele, que considera
"Disparada" uma obra-prima da
música popular brasileira.
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