São Paulo, quinta-feira, 31 de agosto de 2000


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SAÚDE
Cerca de 100 mil pessoas morrem de trauma no país, 40 mil assassinadas; problema foi discutido em evento na Bahia
Vítima de acidente "congestiona" serviços

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR

As vítimas de traumas por acidentes de carro e armas de fogo estão "congestionando" os serviços de pronto-socorro e sugando mão-de-obra e recursos destinados à saúde.
Pelo menos 600 mil pessoas a cada ano saem feridas, muitas com sequelas graves, de batidas de carro, brigas, tentativas de homicídio, acidentes de trabalho e envenenamento. Oficialmente, cerca de 110 mil morrem de trauma a cada ano no país, 40 mil delas assassinadas. Se os profissionais, leitos, tomógrafos e ressonâncias magnéticas envolvidas no socorro a essas vítimas fossem deslocados para outros tratamentos, a fila das cirurgias eletivas, por exemplo, seria reduzida para menos de um terço.
O mais grave é que esse número de vítimas vem crescendo a uma taxa de 2% a 3% ao ano. São Paulo registra o maior crescimento, com um aumento anual de 3%, seguido de Vitória, Recife, Distrito Federal e Rio de Janeiro. Nessas cidades, pelo menos a metade dos leitos de UTI de neurologia está ocupada por vítimas de traumas.
A tragédia do trauma no país foi lembrada ontem durante o 6º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, que acontece em Salvador. Os dados são do Ministério da Saúde, mas o alerta foi feito pela nova direção da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), que toma posse hoje.
A associação, que reúne mais de 2.000 profissionais e entidades de graduação e pós-graduação que pesquisam e lidam com saúde coletiva, elegeu a violência e os acidentes como prioridades de emergência.
"O trauma é hoje a principal causa de redução de anos de vida do brasileiro", disse José Carvalho de Noronha, do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, que assume hoje a direção da Abrasco.
Paulo Eduardo Elias, do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, diz que a guerra ganha contra as doenças infecto-contagiosas nos últimos 30 anos está sendo perdida para os acidentes e agressões interpessoais. "O Brasil está caindo no Índice de Desenvolvimento Humano por conta dos anos de vida perdidos com o trauma", disse Elias.
No quesito violência e acidentes, o Brasil só perde para a Colômbia na América Latina. "No mundo, estamos no nível da África do Sul", diz Noronha. A Organização Panamericana da Saúde já conferiu à violência o status de principal epidemia latino-americana.
Tão grave quanto o cenário do trauma é a falta de pesquisas nessa área no país. "Pretendemos criar centros de pesquisa multidisciplinar com participação de médicos, engenheiros, sociólogos e economistas para entender melhor as causas dos acidentes e da violência e poder agir nas suas origens", diz Elias.
Na abertura do congresso, na noite anterior, o ministro José Serra, da Saúde, anunciou a criação de uma agência nacional de pesquisas em saúde que, de início, já receberá R$ 150 milhões.
"Vamos defender a realização de pesquisas que possam trazer resultados práticos na questão do trauma", disse Noronha.
Outra prioridade eleita pela Abrasco é a redução das desigualdades na saúde. O desafio é que as causas estão no desemprego, na falta de saneamento básico e no acesso à educação.
A relação entre essas condições e o aumento de vítimas do trauma é direta. De acordo com estudos do Banco Mundial, a maior distância econômica entre as classes está entre as principais causas da violência.


O jornalista Aureliano Biancarelli viajou a convite da direção da Abrasco


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