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Francisco Daudt

Pacto antinatural

Bancar-se, para os homens, é um fato da vida; para as mulheres, porém, é uma dura conquista recente

CHAMA-SE PACTO antenupcial ("ante", de antes, e não "anti", de contra) o acordo que um futuro casal faz para estabelecer separação total de bens. Ou seja, o que é meu será sempre meu e não se misturará com o que será sempre seu. Serve para que o "meu bem" dos tempos de namoro não se transforme em "meus bens" na hora da separação.

Hoje também se aplica às uniões estáveis, podendo ser formalizado em cartório facilmente. Quanto a essas últimas, deve-se estar atento ao "timing", pois haverá juízes que considerarão haver união estável com um ano de namoro, mesmo quando o casal mora em casas diferentes.

A grande maioria dessas propostas nada românticas é feita por homens e ressentida pelas mulheres. "Mas, como?", pode-se perguntar, uma vez que o feminismo estimulou as mulheres a terem seu próprio trabalho, buscar seu sustento e independência de família ou de homem, e a ter orgulho disso. Inclusive, mulheres que ganham mais do que um marido preguiçoso seriam as primeiras a querer propor o tal pacto, mas raramente o fazem.

É profundamente injusto propô-lo, se o marido ou companheiro pedir à mulher para abandonar emprego, estudos ou carreira para se dedicar à gerência da casa e à criação dos filhos. Neste caso, ela terá toda a razão de querer reverter o pacto. E tem grandes chances de consegui-lo na Justiça.

Então, por que a maioria das mulheres se ressente dele, ou não o propõe?

Porque ele vai contra a natureza humana. Por centenas de milênios, o fardo da procriação sempre foi maior para a mulher que para o homem. Elas sempre precisaram de ajuda. A participação do homem pode se dar em segundos. A da mulher é muito maior: ela engravida; corre riscos de vida na gravidez, no parto e depois dele; amamenta; precisa zelar pela cria, que corre perigo de morrer se não for bem acompanhada etc. Não é à toa que a seleção natural favoreceu aquelas que conseguiram o apoio de um ou mais homens, mesmo que o filho não seja deles. Estas tiveram mais chances de que seus filhos vingassem.

Ora, é impossível mudar rápido um traço genético tão forte. Vejo mulheres "independentes ressentidas" ("Homem nenhum me banca! Eu ralo, mas eu tenho o meu orgulho!"). Não se ouvirá um homem dizendo tal coisa, pois, para eles, bancar-se é um fato da vida, e para a mulher é uma dura conquista recente.

O romantismo agrava tudo ("Você está se casando já pensando na separação?"). Ora, o fato de existir um contrato implica a possibilidade de destrato, uma vez que a união é também a formação de uma sociedade comercial ("Ai, que horror!").

Outra agravante é que as mulheres descobriram o orgulho de trabalhar, mas ainda não descobriram bem seu valor em dinheiro. Por mais dedicadas que sejam, são péssimas negociadoras salariais. Patrões sovinas se aproveitam disso com alusões emocionais: "Nesta empresa, somos como uma família".

Mas as coisas estão mudando. Minha filha (bem assalariada) faz graça comigo: "Meu pai pensou que ia ter que me sustentar pelo resto da vida". É verdade...

fdaudt2@gmail.com

AMANHÃ EM COTIDIANO
Antonio Prata

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