|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"HOSPITAL"
Controladora da Eletropaulo admite situação de "default técnico'; executivo diz que quitar dívida é "quase impossível"
AES deixa de pagar US$ 85 mi ao BNDES
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
A AES Elpa, que controla a Eletropaulo no Brasil, deixou de pagar ontem uma parcela de US$ 85
milhões de sua dívida com o
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Em nota enviada ontem à
Bovespa (Bolsa de Valores de São
Paulo), a empresa admite a situação de "default técnico".
O grupo americano AES controla a Eletropaulo por duas subsidiárias, a AES Elpa, holding que
detém as ações ordinárias da
companhia, e a AES Transgás, dona das ações preferenciais. As
duas holdings devem aproximadamente US$ 1,1 bilhão ao
BNDES.
Em entrevista à Folha, o presidente da Eletropaulo, Steven
Clancy, 41, afirmou que, nas condições atuais, a divida da Eletropaulo é muito difícil de ser paga.
"Quase impossível", disse.
Apesar de toda essa dificuldade,
Clancy espera chegar a um acordo, nos próximos dias, com o
BNDES na negociação para o
reescalonamento da dívida.
Clancy admite que, em razão
dos resultados obtidos com a Eletropaulo, o interesse da AES em
investir no Brasil diminuiu bastante nos últimos meses. Segundo
ele, nos últimos cinco anos, a empresa investiu US$ 4 bilhões e obteve de retorno apenas US$ 311
milhões, ou seja, 0,8% do total do
investimento.
Dólar e racionamento
Clancy atribui esse resultado a
dois fatores. Em primeiro lugar, à
desvalorização do real. Como a
dívida com o BNDES é dolarizada, mas a receita da Eletropaulo é
em real, a dívida em reais aumentou significativamente.
De acordo com ele, a dívida original da Elpa com o BNDES era de
R$ 1 bilhão. A empresa já pagou
R$ 928 milhões, mas ainda deve
R$ 1,7 bilhão. Já a dívida original
da Transgás era de R$ 2 bilhões. A
Eletropaulo pagou R$ 1,1 bilhão e
deve, ainda, US$ 1,9 bilhão.
Os efeitos do racionamento, de
acordo com Clancy, também foram desastrosos tanto para a Eletropaulo como para as distribuidoras em geral. "Não conheço nenhum caso no mundo em que, do
dia para a noite, o consumidor é
obrigado a cortar 20% de energia", afirma o presidente da Eletropaulo.
Segundo Clancy, as perdas do
racionamento custaram à Eletropaulo cerca de US$ 450 milhões
em perdas de margens em 2001 e
2002, o que foi apenas parcialmente compensado pelo empréstimo do BNDES.
Clancy reconheceu que, nas últimas semanas, ocorreram algumas dificuldades na negociação
da dívida com o BNDES em razão
da mudança de interlocutores
com o novo governo. "Como se
trata de pessoas novas, nós tivemos que explicar de novo toda a
história da dívida", afirmou.
Ele disse, no entanto, que não há
problemas de relacionamento
com o BNDES. "Nós estamos há
tanto tempo sentados na mesma
mesa com o BNDES que viramos
até bons amigos", afirmou.
Mesmo assim, Clancy afirmou
que irá procurar, na próxima semana, outras autoridades do governo para explicar a dívida da
Eletropaulo. Entre eles, o ministro
do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, a quem o BNDES é
subordinado.
Nesta semana, Clancy se reuniu
com o secretário-executivo do
ministério, Márcio Fortes de Almeida. "Nós queremos mostrar
ao governo que não somos "bad
boys" [bandidos", e sim "good
guys" [mocinhos" em relação ao
Brasil", disse.
Sem querer entrar em detalhes
da proposta encaminhada por ele
ao BNDES na quinta-feira, Clancy
disse que o principal objetivo da
Eletropaulo é ter mais tempo para
poder pagar a dívida. Não disse,
no entanto, qual o prazo que ele
quer para acertar os débitos.
Para o presidente da Eletropaulo, é difícil fazer uma previsão para a empresa, já que prognósticos
dependem do comportamento do
câmbio e da recuperação do consumo de energia -que, hoje, em
razão do racionamento, está no
mesmo nível de 1998.
Clancy não acredita que o
BNDES exerça o direito de executar a dívida da Eletropaulo, ou seja, de entrar na Justiça para retomar a empresa. "Ninguém ganha
se iniciarmos agora uma batalha
judicial com o BNDES, nem o
próprio BNDES", disse Clancy.
Sigilo
Procurado pela Folha, o BNDES
informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não iria fazer nenhum tipo de comentário
sobre o "default" da Eletropaulo.
O banco alegou cláusulas de sigilo
bancário incluídas no contrato de
financiamento que não permitem
divulgar informações sobre atrasos nos pagamentos ou renegociação de dívidas.
Apesar do "default técnico" da
Eletropaulo, as ações preferenciais da empresa subiram 9,9% e
lideraram as altas ontem, na Bovespa. Os investidores acreditam
que a empresa será "socorrida"
pelo BNDES. As declarações de
Carlos Lessa, presidente do
BNDES, são nesse sentido.
Texto Anterior: Painel S/A Próximo Texto: Entrega de outras empresas do grupo americano deve ser solução Índice
|