São Paulo, segunda, 1 de fevereiro de 1999

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MERCADO TENSO
Crise teria sido evitada se medidas fiscais tivessem sido aprovadas há três semanas, diz diretor do FMI
Fischer, do Fundo, fala por Malan em debate

do enviado especial a Davos


Foi pura coincidência, mas uma coincidência irônica para o momento que o Brasil atravessa: Stanley Fischer, vice-diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional) foi escalado ontem para substituir o ministro Pedro Malan (Fazenda).
Fischer tomou o lugar de Malan no debate "Navegando nas correntes cruzadas da globalização", no âmbito do encontro anual-99 do Fórum Econômico Mundial.
Para acentuar a ironia, Carlos Represas, vice-presidente executivo da Nestlé, fez a Fischer uma pergunta sobre o Brasil, que o funcionário do FMI não hesitou em responder -e, talvez, da mesma forma que Malan o faria.
"A crise teria sido evitada se as medidas fiscais tivessem sido aprovadas há três semanas", disse Fischer, aludindo ao pacote de ajuste fiscal que está em final de tramitação no Congresso.
O representante do FMI defendeu, para o futuro imediato "uma política monetária crível, clara e transparente para os mercados".
Com ela (e o pacote fiscal), Fischer supõe que possa ser resgatada a credibilidade, o que, no entanto, leva tempo, admitiu.
Terminou a resposta com uma frase que o presidente Fernando Henrique vem usando: "O Brasil vai sair mais forte" (da crise).
Durante o debate, Fischer fez uma dura crítica aos críticos do FMI, mas, ao mesmo tempo, admitiu inadequações nos programas do Fundo para a Ásia, em tudo similares ao que está sendo recomendado ao Brasil.
Fischer ficou irritado com as críticas à ausência de defesas sociais em tais programas, citou as que foram incluídas nos executados na Ásia e se disse "ofendido por ouvir coisas que não são verdadeiras".
Defendeu igualmente a elevação das taxas de juros, imposta aos países asiáticos e ao Brasil e fortemente criticada por economistas como Jeffrey Sachs: "O aumento dos juros funcionou. Eles podem baixar quando a moeda se estabiliza, como ocorreu na Tailândia".
Mas admitiu que o Fundo avaliou mal a extensão da recessão na Ásia, o que, por sua vez, levou a exigir políticas fiscais "um pouco apertadas demais no começo".
No Brasil, o ajuste fiscal terá o imponente tamanho de cerca de R$ 27 bilhões.
Fischer não foi o único a lamentar o que deixou de ser feito em tempo no Brasil.
Os líderes mundiais reunidos em Davos mostraram certa perplexidade com o fato de que, embora houvesse certa semelhança entre a crise brasileira e a do México (94), as lições desta não foram assimiladas pelas autoridades brasileiras.
Essa perplexidade surgiu durante as discussões informais das autoridades governamentais presentes em Davos e relatada ontem aos jornalistas pelo senador norte-americano John Kerry e por Howard Davies, da "Financial Services Authority", o organismo regulador britânico. Os dois são os relatores do encontro.
A semelhança, contou Davies, estava no fato de que o México também reagiu, inicialmente, à fuga de capitais mudando a sua banda cambial. Durou três dias.
Os líderes mundiais acharam que o Brasil, dada a experiência mexicana, não repetiria esse erro de "gerência de curto prazo".
Davies, no entanto, alertou que a discussão sobre o Brasil fora muito ligeira, por estar a crise em pleno andamento e por não haver uma única autoridade brasileira presente aos encontros informais.
O chanceler Luiz Felipe Lampreia esteve em Davos, mas não participou dessas reuniões.
(CLÓVIS ROSSI)



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