São Paulo, segunda, 1 de fevereiro de 1999

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Banco Mundial contabiliza 100 crises nos últimos 25 anos e espera mais

do enviado especial a Davos

Joseph Stiglitz, vice-presidente sênior do Banco Mundial, fez as contas e concluiu: nos últimos 25 anos, 80 ou até 100 países sofreram crises econômicas, dependendo do critério a ser utilizado para definir crise.
Má notícia? É, mas não é a pior.
"Com qualquer aperfeiçoamento que se venha a adotar na prevenção de crises, ainda assim haverá crises, menos virulentas, menos freqüentes, mas crise, de todo modo", diz Stanley Fischer, vice-diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), exatamente o organismo que deveria prevenir ou gerenciar as crises.
Reforça Heiner Flassbeck, secretário de Finanças da Alemanha: "As crises são inevitáveis".
De volta a Stiglitz: "Mesmo economias bem gerenciadas podem ser adversamente afetadas".
Contrapõe Fischer: "Países que adotam boas políticas se saem melhor, mas é também verdade que os mercados reagem excessivamente, criando ondas de pessimismo ou de otimismo".
Tudo somado, torna-se absolutamente natural que a agenda internacional esteja dominada pela expressão "reforma da arquitetura financeira internacional".
Na prática, significa reformar o modo de operar do FMI, do Banco Mundial, dos bancos privados e até dos governos.
Mas, até agora, o único passo adiante na reforma foi a produção de papéis a respeito dela.
Há divergências entre os governos dos países ricos sobre o que fazer para conter a turbulência global, mas há, igualmente, discórdias sobre os culpados e sobre a distribuição dos custos entre os envolvidos.
Exemplo claro: a crise asiática é atribuída, em grande medida, ao fato de que seus sistemas financeiros não estavam preparados para a liberalização do movimento de capitais, que trouxe enorme fluxo de recursos para tais países.
Mas, lembra Stiglitz, uma das crises recentes ocorreu em países escandinavos, "cujas instituições são muito sofisticadas".
Mesmo um banqueiro (Frank Newman, presidente do norte-americano Bankers Trust) admite: "Freqüentemente, os empréstimos (aos países ditos emergentes) são feitos por gente que não faz uma análise profunda".
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Culpa Como quem empresta são instituições de países ricos, não basta culpar os receptores e a fragilidade de suas instituições.
É por isso que Ginandjar Kartasasmita, ministro da Economia, Finanças e Indústria da Indonésia (uma das vítimas mais machucadas pela crise), cobra:
"É preciso melhorar o padrão profissional dos que fazem empréstimos. Eles não avaliaram os riscos".
Essa é justamente uma das razões centrais pelas quais o FMI está sob uma barragem formidável de críticas.
Jeffrey Sachs (Universidade de Harvard), por exemplo, vive dizendo que os programas de ajuda do FMI acabam sendo apenas uma fiança às instituições financeiras globais.
O dinheiro do Fundo vai para os países em crise, mas para que paguem os credores, que ou nada perdem ou perdem menos do que deveriam pela inadequada avaliação de riscos.
Admite Fischer: "O problema mais árduo de se resolver para a reforma da arquitetura financeira global é o envolvimento do setor privado".
Envolvimento, no caso, é uma palavra cuidadosa para dizer que as instituições financeiras devem assumir sua parte no custo.
Se o debate se ampliar para outro tipo de investimentos (os fluxos de capital que buscam lucros rápidos e suculentos), as divergências se ampliam mais.
Até um ultraliberal como o secretário norte-americano do Tesouro, Robert Rubin, admite que "fluxos excessivos não são uma coisa saudável".
Mas não há o menor consenso em torno de como evitá-los e menos ainda em torno de como evitar que sigam o caminho inverso, a fuga de volta para casa depois de realizados os lucros.
Tudo somado, difícil discordar de Eisuke Sakakibara, responsável pelas Finanças Internacionais do Japão, que vem dizendo há tempos e repete agora:
"Não se trata de uma crise asiática, mas de uma crise do capitalismo global".
(CR)


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