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OPINIÃO ECONÔMICA
Boi na linha
BENJAMIN STEINBRUCH
Dá gosto navegar pelas estatísticas do comércio exterior
brasileiro, no site do Ministério do
Desenvolvimento. É um passeio
cheio de boas imagens sobre os
avanços das exportações.
O gráfico da evolução recente do
superávit comercial parece uma
perfeita escada. O primeiro degrau, em 2001, mostra um saldo de
US$ 2,6 bilhões. Nos anos seguintes, há uma subida constante, para US$ 13 bilhões em 2002, US$
24,7 bilhões em 2003 e US$ 33,7 bilhões em 2004.
Todos os dados indicam que o
país está finalmente entrando pra
valer no mercado global.
Já há quase 19 mil empresas exportadoras, das quais 9.400 pequenas e médias.
A participação das exportações
no PIB, que era de 6,5% em 1998,
subiu para 16,1% no ano passado.
A fatia brasileira do comércio
mundial passou pela primeira vez
em mais de uma década a barreira de 1%, que parecia intransponível -foi de 1,1% em 2004.
Cinco anos atrás, os juros que o
país pagava para sustentar sua dívida externa comiam 34% das receitas de exportações. Hoje, comem apenas 16%.
São avanços notáveis, que ajudam a explicar a atual fase de
crescimento da economia e do emprego. Só não os enxerga quem
torce contra o país ou tem complexo de inferioridade.
A despeito da importância das
exportações de commodities como
soja e minério, o Brasil não está
mais na lista dos infelizes exportadores de produtos básicos, que vivem à mercê de erráticas oscilações de cotações internacionais.
No ano passado, quase 70% das
vendas externas foram de manufaturados ou semimanufaturados.
O item mais importante da pauta
brasileira é material de transportes -leia-se veículos automotores
e aviões-, que rendeu US$ 16 bilhões em 2004.
Por que estou a enumerar isso
tudo? Primeiro porque não tenho
vergonha de cantar as boas coisas
do Brasil -muito pelo contrário,
orgulho-me delas. Segundo porque persiste um perigoso desprezo
pelo risco que a atual valorização
do real representa para as exportações. Ignora-se o fato irrefutável
de que os avanços no comércio exterior, citados acima, são basicamente decorrentes da política
cambial correta adotada nos últimos anos.
Na semana passada, o dólar
caiu para até R$ 2,56 e recuperou-se um pouco depois que a ata do
Copom trouxe alguma esperança
de interrupção do processo de alta
dos juros. Um exercício curioso é
tomar o valor do dólar no início
do Plano Real, na base R$ 1 para
US$ 1, e aplicar a correção da inflação desses dez anos, de 320%
(IGP-DI). Resultado: um dólar de
R$ 4,20. Mesmo descontando desse valor a inflação americana, da
ordem de 27% no período, está óbvio que o câmbio continua muito
aquém de um nível ideal para remunerar e estimular o movimento
exportador de manufaturados.
Com o foco fechado numa meta
de inflação ambiciosa, tenta-se
usar novamente o câmbio como
âncora para os preços. É uma ilusão olhar para os números das exportações no primeiro bimestre,
que continuam bons, e concluir
que o dólar a R$ 2,5 não prejudica
as vendas de manufaturados. Alguns setores já sentem o baque,
mas o efeito ruim do câmbio aparecerá a médio e longo prazo,
quando forem renegociados os
contratos de exportação. Além disso, a baixa remuneração desestimula a entrada de novas empresas no mercado externo.
Na semana passada, o economista Affonso Celso Pastore sugeriu taxar com IOF as entradas de
capitais de curto prazo no país. Essa taxação seria uma forma de reduzir o fluxo de recursos que ingressam no mercado para degustar os altos juros internos e ajudam a derrubar a taxa do dólar.
A proposta de Pastore ganhou
aplausos e sofreu críticas. De qualquer forma, quando um economista respeitado, a despeito de
reafirmar sua crença nos instrumentos ortodoxos tradicionais de
política monetária, chega a sugerir medidas heterodoxas como essa, é sinal de que tem boi na linha.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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