São Paulo, segunda-feira, 01 de julho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MERCADO FINANCEIRO

Chegada de bancos estrangeiros ao país, a partir de 95, não aumentou a concorrência, segundo o Ipea

Abertura não fez juros caírem, diz estudo

RICARDO REGO MONTEIRO
DA SUCURSAL DO RIO

Além de não conferir maior solidez ao sistema financeiro brasileiro em momentos de crise, a abertura dos bancos à concorrência estrangeira, a partir de 1995, resultou na oligopolização do setor no Brasil.
A conclusão, que pode ser constatada de forma empírica por qualquer empresa em busca de crédito mais barato, ganhou comprovação acadêmica em estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Com o título "Desnacionalização do Setor Bancário e Financiamento das Empresas: A Experiência Brasileira Recente", o estudo foi coordenado pelos economistas Carlos Eduardo de Carvalho (PUC-SP), Rogério Studart (Cepal) e Antônio José Alves Jr. (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro).
O levantamento conclui que, em lugar de melhorar as práticas bancárias do país, o que se verificou com a abertura foi um fenômeno batizado por Carvalho de "tupiniquinzação" dos bancos estrangeiros.
Acostumados à competição em seus mercados de origem, os bancos estrangeiros não só falharam em contribuir para o aumento da concorrência como também adotaram práticas comuns ao setor bancário brasileiro, como juros e tarifas altos.
Tais resultados contrastam, na prática, com as promessas feitas pelo governo, no início da liberalização do segmento bancário. A abertura foi inaugurada nos primeiros anos do governo de Fernando Henrique Cardoso, em um contexto internacional marcado por desregulamentação de mercados e grande fluxo de dólares para países emergentes.

Oligopólio
A redução das taxas de juros, como resultado da concorrência entre as instituições financeiras, era um dos argumentos mais fortes do governo para justificar a abertura. O ministro da Fazenda, Pedro Malan, chegou a recorrer ao argumento na exposição de motivos nš 311 do governo, assinada por ele.
"A prática demonstra que não há nenhuma indicação de que os bancos estrangeiros operem com taxas de juros mais baixas ou "spreads" [diferença entre os custos de captação e repasse de recursos aos clientes] mais favoráveis aos clientes", diz Carvalho.
Ele também identificou, por meio do estudo, um comportamento homogêneo nas taxas praticadas por instituições nacionais e estrangeiras. "As taxas de juros de instituições nacionais e estrangeiras movimentam-se em grupo. Isso caracteriza uma oligopolização do setor bancário brasileiro", diz o economista da PUC de São Paulo.
"Não há nenhuma evidência de que a maior presença de estrangeiros tenha contribuído para reduzir os custos bancários ou aumentar a solidez do sistema financeiro", afirma Carvalho, que não identificou sequer uma atitude arrojada dessas instituições nos mercados emergentes. Principalmente em momentos de crise, como a vivida pela Argentina nos últimos meses.
Nesses momentos, afirma Carvalho, a decisão de permanecer ou não em um determinado mercado obedece exclusivamente à estratégia internacional de cada instituição. Na maior parte dos casos, como na Argentina, verifica-se o êxodo puro e simples do mercado em crise, com a suspensão quase automática das linhas de crédito.

Febraban
Embora admita que os custos bancários no Brasil sejam proibitivos, a Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos) não concorda com algumas das conclusões do trabalho do Ipea.
O diretor de economia da entidade, Geraldo Gardenali, afirma que a entrada de bancos estrangeiras contribuiu para a melhoria e a modernização dos serviços prestados no país.
O executivo, que também exerce a presidência da Nossa Caixa, transfere para o governo a responsabilidade sobre os altos "spreads" dos bancos brasileiros. Segundo ele, tais custos podem ser explicados por fatores relacionados à política econômica do país, como a alta carga tributária e os custos de operação dos bancos.
Gardenali recorre às altas taxas de inadimplência do país como justificativa. "À medida que tivermos uma redução do risco de crédito, com certeza as taxas serão menores."
Apesar de todas as críticas, o estudo do Ipea reconhece que os bancos estrangeiros ainda não dispuseram de tempo suficiente para "digerir" os ativos adquiridos no Brasil. Com isso, os bancos arcariam com custos que dificultam ainda mais a redução das taxas praticadas no país.
O diretor da Febraban diz que, em muitas aquisições, as instituições estrangeiras se depararam com diversos "esqueletos" (no jargão econômico, dívidas antigas) não previstos antes da compra. Tais "surpresas" contábeis, segundo ele, teriam exigido não só investimentos adicionais por parte dos compradores, como maior prazo para a conclusão do processo de incorporação.


Texto Anterior: Dúvidas: Letra hipotecária tem vantagem fiscal
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.