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ENTREVISTA
Para deputado, governo FHC levou país por duas vezes à insolvência
Dólar não vai parar de subir, diz Delfim
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O presidente Fernando Henrique Cardoso ficará para a história
como o governo que levou o país
por duas vezes a uma situação de
insolvência. A afirmação é do deputado federal Delfim Netto
(PPB-SP), 74, ao analisar a atual
crise que atravessa o país.
Segundo ele, a primeira vez foi
em 1998, quando o país teve que
recorrer ao FMI (Fundo Monetário Internacional). A segunda é
agora, com a crise instalada no setor privado. A única solução, na
opinião de Delfim, é o acordo
com o Fundo. O dólar, a seu ver,
não irá parar de subir enquanto
não entrar o dinheiro do FMI. A
seguir, os principais trechos da
entrevista.
Folha - Até onde o dólar pode subir?
Delfim Netto - Normalmente, os
preços sobem para resolver um
problema de escassez. Se falta feijão, os preços do produto sobem
até chegar a um nível de equilíbrio
entre a oferta e a demanda. No
câmbio, isso deveria acontecer
também, mas não é isso o que
acontece agora. Os bancos lá fora
cortaram o crédito comercial e isso enxugou a oferta de dólares no
mercado. As empresas não estão
conseguindo renovar seus empréstimos e se tornando inadimplentes. Isso fez com que se instalasse um processo de pânico. Para
resolver essa situação, o Brasil
precisa desesperadamente fechar
um acordo com o FMI para poder
repor essas linhas de crédito. O
Fundo é a única entidade que pode suprir essa necessidade de dólares do mercado. Ninguém mais
vai oferecer esses recursos. Os
bancos vão tentar sair fora. As
pessoas precisam entender que,
quanto mais subir o dólar, mais
aumentará a inadimplência e
mais vai subir o dólar. É uma falha
da economia de mercado. O mercado não é capaz de coordenar esse processo. A subida do dólar
não vai trazer o câmbio para um
preço de equilíbrio. Só vai criar
mais problemas.
Folha - A que o sr. atribui esse
descontrole?
Delfim - Na verdade, esse problema no câmbio é simplesmente
mais uma manifestação de que os
postulados defendidos pelo governo eram falsos. O governo dizia, por exemplo, que, se a dívida
era privada, não tinha com o que
se preocupar, já que o setor privado era muito mais esperto e não
iria criar problemas.
Folha - O sr. acha que essa situação é fruto só de erros do governo?
A crise externa também não contribuiu?
Delfim - A crise externa existe
mesmo, mas basta olhar os casos
do Chile, do México, da Coréia, da
Malásia... O risco de todos esses
países aumentou, mas foi muito
maior no Brasil, o que mostra que
nossos problemas internos são
maiores. O que houve, para chegarmos a essa situação, foi um
acúmulo de erros de política econômica. O primeiro erro foi ter
congelado o câmbio e usado os
recursos externos de forma irresponsável, até acumularmos US$
200 bilhões de déficit em conta
corrente nos últimos oito anos.
Não adianta discutir o passado,
mas a verdade é que o Brasil foi levado duas vezes a uma situação
de insolvência pelo governo Fernando Henrique. A primeira foi
em 98, quando o governo correu
para o Fundo e conseguiu o empréstimo de US$ 41 bilhões. Agora, o governo termina com o setor
privado quebrando.
Folha - E se não vier o dinheiro do
Fundo?
Delfim - Se não vier o dinheiro
do Fundo, não tem como resolver
o problema. Só o acordo do Fundo pode normalizar a situação.
Folha - Quanto o sr. imagina necessário de dinheiro do Fundo para
normalizar a situação?
Delfim - Na minha opinião, é alguma coisa entre US$ 10 bilhões e
US$ 20 bilhões.
Folha - As eleições também não
são um fator de incerteza?
Delfim - Quem criou esse terror
foi o próprio governo, quando
disse que ou o povo elege o candidato do governo ou o país poderá
virar a Argentina. O governo
criou esse terror e agora está sendo comido por ele.
Folha - O sr. acha que será necessário o governo aumentar os juros?
Delfim - Não irá adiantar nada
aumentar os juros agora. O país
está diante de um processo muito
mais sério. O problema é de falta
de crédito. As linhas de crédito
bancário secaram. Para combater
isso, seria preciso o Brasil ter o dobro do seu atual nível de reservas.
A nossa política econômica depende sempre de bom tempo para ficar firme. Cada vez que há
uma ameaça de trovoada, é necessário pousar o avião no FMI. Não
acho nenhum demérito o governo ter que recorrer ao Fundo.
Aliás, quem dizia que ir ao Fundo
era sinal de que o país tinha sido
mal administrado era a oposição
que hoje está no governo. Agora,
eles vão ao Fundo com orgulho. Ir
ao Fundo é uma contingência. Ele
existe para isso. Só que ir ao Fundo a cada quatro anos é bem diferente. Se não fosse a intervenção
do Fundo em 98, Lula hoje estaria
saindo o governo, a Bolsa estaria
subindo e todo mundo estaria soltando fogos. Agora, nós estamos
de novo com a ameaça do Lula.
Folha - O sr. acredita no fechamento do acordo com o Fundo?
Delfim - O Fundo deve ser um
pouco leniente com o Brasil, afinal ele também apoiou essa política. A aposta deu errado. Durante
os anos de prosperidade do mundo, de 94 a 98, o que fizemos foi
uma política antiexportação. Enquanto o mundo se expandia, nós
estávamos construindo uma armadilha. Agora que o mundo está
murchando, nós caímos nessa armadilha. E não foi por falta de avisos. Fernando Henrique vai ficar
para a história por ter levado o
país por duas vezes a uma situação de insolvência.
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