São Paulo, domingo, 01 de agosto de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Setor automotivo importa até barra de aço por avião

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

As indústrias que compõem a cadeia do setor automobilístico estão dando nó em pingo d'água para atender ao crescimento de 14,8% da produção das montadoras no primeiro semestre do ano. Há fabricantes de autopeças, como a Bosch, importando barras de aço por via aérea a um custo altíssimo, para fazer frente ao desabastecimento interno.
A unidade de sistemas diesel da empresa, localizada em Curitiba, chegou a mandar um portador à Alemanha para trazer, numa mala, pequenos lotes de peças para garantir a produção de um dia. "Exportamos quase metade dos sistemas de injeção que produzimos, e nossos clientes locais, fabricantes de caminhões e tratores, também têm compromissos no exterior. Não podemos deixar de atender as duas demandas", diz Ronaldo Reimer, vice-presidente.
Outras, de menor porte, como a Paranoá, fabricante de mangueiras para sistemas automotivos, tentam se defender da escassez de borracha carregando estoques para três meses de produção. Em tempos normais, o estoque é para 45 dias. "Tentamos nos proteger formando estoques desde o início do ano, mas o custo dessa operação é alto", afirma Luiz Gustavo Klass Mwosa, diretor da empresa.
A ginástica que os fornecedores das montadoras vêm fazendo para garantir o abastecimento "just-in-time" das linhas de montagem está chegando ao limite. Na sexta-feira, a fábrica de caminhões da Ford parou a produção, devido à falta de peças, para que seus fornecedores retomassem o fôlego.
Nem sempre, porém, a parada é organizada. Desde março, todas as montadoras têm sido obrigadas a interromper a produção por uma hora, duas a três vezes por semana, por falta de componentes, conta Mário Milani, vice-presidente do Sindipeças (sindicato dos fabricantes de autopeças).
Como presidente da Sogefi Filtration do Brasil, fabricante italiana de filtros e suspensão, Milani também vem tendo dificuldades com o fornecimento das siderúrgicas locais. Por isso foi obrigado a trocar um tipo específico de aço por outro, para não interromper a produção e atender os clientes.

Crise de crescimento
Da multinacional alemã ou italiana ao pequeno fabricante local de autopeças, o objetivo é um só: contornar a "crise de crescimento" que pegou a cadeia automotiva despreparada, após duas décadas de estagnação da economia.
Até o mês de junho, foi fabricado 1,038 milhão de veículos no país, de acordo com a Anfavea (associação das montadoras). A projeção do setor é chegar a 2,050 milhões de unidades fabricadas até o final do ano. "Se a produção de veículos bater em 2,1 milhões, isso vai embolar o meio-de-campo", afirma David Wong, gerente da Booz Allen & Hamilton.
Milani diz que é muito difícil romper a barreira das 2,1 milhões de unidades: os fornecedores locais de autopeças não conseguiriam atender a demanda. "A indústria automobilística é o topo de uma pirâmide que se equilibra sobre uma base frágil", diz ele.
Abaixo dela estão os sistemistas, empresas multinacionais que montam partes e peças e fornecem sistemas completos às montadoras. Mas eles dependem de cerca de 3.000 pequenos e médios fabricantes nacionais de autopeças que os abastecem. Segundo Milani, a maioria deles tem hoje dificuldades financeiras, dívidas tributárias e pouco acesso a crédito para poder fazer investimentos.
De olho no futuro, a Valeo, multinacional francesa, líder em sistemas de iluminação, mapeou os gargalos existentes em suas nove fábricas no Brasil e agora faz o mesmo com seus fornecedores.
A empresa está investindo em expansão de capacidade. Mas, até que os investimentos estejam prontos, ela negocia com os empregados a criação do quarto turno de trabalho para funcionar ininterruptamente. "Estamos nos preparando para um aumento de até 25% na demanda, nos próximos anos", afirma Alain Keruzore, presidente da Valeo.


Colaborou Fábio Amato, da Agência Folha


Texto Anterior: Crescimento remendado: Empresas driblam gargalo de infra-estrutura
Próximo Texto: Crescimento remendado: Exportador cria "overbooking" em navios
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.