São Paulo, terça-feira, 01 de outubro de 2002

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EM TRANSE

Disparada do dólar leva banco a abandonar índice de 4% por um maior, de 5%; alta dos preços será calibrada pelos juros

BC admite estouro da inflação em 2003

NEY HAYASHI DA CRUZ
GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Banco Central desistiu de perseguir a meta de 4% fixada para a inflação de 2003. De agora em diante, o BC irá usar a taxa de juros para manter a alta dos preços em até 5% no ano que vem. A mudança foi anunciada ontem pelo diretor de Política Econômica da instituição, Ilan Goldfajn.
Segundo Goldfajn, a mudança foi feita para ajustar a meta do governo aos choques sofridos pela economia brasileira. Entre eles, a disparada do dólar. Esses choques seriam responsáveis por um aumento de até um ponto percentual na inflação de 2003.
A explicação do BC é que o efeito desses choques sobre a inflação não pode ser compensado por uma eventual elevação dos juros. Para 2003, os choques seriam dois. Um está ligado ao que o BC chama de "inércia inflacionária". Em outras palavras, espera-se que parte dos choques sofridos pela economia neste ano ainda afetarão a inflação de 2003.
Outro choque estaria relacionado aos preços administrados pelo governo, como as tarifas públicas e os combustíveis. Esses preços são muito influenciados pelo dólar. Somados, os efeitos de ambos os choques sobre a inflação ficariam em torno de um ponto percentual, nas contas do BC.
Como tanto os preços administrados como os efeitos da inércia inflacionária são pouco sensíveis às variações dos, o BC faz uma espécie de "expurgo" desses choques sobre a meta oficial. Ou seja, a meta oficial continua a ser de 4%, mas o número a ser perseguido pelo BC passa para 5%.
Pelo sistema de metas de inflação, a meta central de 2003 foi fixada em 4%, mas pode variar até 2,5 pontos percentuais para cima ou para baixo -a meta terá sido cumprida mesmo que o IPCA, do IBGE, chegue a 6,5% no ano.

Crescimento
Em tese, a mudança na meta a ser alcançada pelo BC abre espaço para o corte nos juros básicos, hoje em 18% ao ano. O BC projeta que, mantida essa taxa, a inflação de 2003 fique em 4,5%. A estimativa foi feita considerando que a cotação do dólar se estabilize em R$ 3,20 e consta do Relatório de Inflação divulgado ontem.
Quando a inflação projetada está abaixo da meta, o BC pode reduzir os juros. Juros são mantidos em níveis elevados para desestimular o consumo, o que favorece o controle dos preços.
O problema é a inflação deste ano, que continua bastante acima do esperado. O BC estima em 6,7% o aumento de preços que deve ocorrer neste ano, bem acima dos 5,5% fixados pelo teto da meta do governo.
A manutenção dos juros elevados explica também o desaquecimento da economia que ocorre neste ano. O BC espera que o crescimento vá ficar em 1,4%, abaixo dos 2% previstos em junho e ligeiramente menor do que o 1,5% estimado em 2001.
De acordo com o BC, o estouro da meta de inflação deste ano e a queda no crescimento são consequências da disparada do dólar ocorrida nos últimos meses. A desvalorização do real seria consequência da "aproximação das eleições e da deterioração da conjuntura internacional".
Esses fatores colaboraram para "agravar as condições de crédito", ou seja, diante do nervosismo do mercado, os bancos ficaram mais cautelosos para emprestar dinheiro a seus clientes.
Além disso, a alta do dólar leva ao aumento dos preços, em especial das tarifas públicas. A maioria das tarifas é corrigida pelo IGP-M, índice de inflação que é bastante afetado por produtos importados. Isso explica, diz o BC, o descumprimento da meta deste ano.
"Os principais focos de incerteza em relação às perspectivas para a taxa de inflação até o final de 2003 referem-se, principalmente, ao comportamento da taxa de câmbio, à evolução da economia mundial e à possibilidade de uma guerra no Iraque e seu impacto sobre os preços dos derivados de petróleo", diz o relatório do BC.


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