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"Brasil está na mesma", diz especialista
Para professor, país ainda tem de enfrentar problemas como "gastos ineficientes do governo, o fardo da tributação e a dívida pública"
Xavier Sala-i-Martin, um dos responsáveis pelo ranking de competitividade global, também faz alerta sobre riscos na China
DA REPORTAGEM LOCAL
"Se o Brasil melhorou dramaticamente nos últimos anos,
ainda há um substancial
"spread" nos juros, gastos do governo ineficientes, o fardo da
tributação e a dívida pública",
diz Xavier Sala-i-Martin, professor da Universidade Columbia e um dos responsáveis pela
elaboração do ranking de competitividade global do Fórum
Econômico Mundial.
Sala-i-Martin é enfático ao
afirmar que a entrada da Venezuela não traria maior competitividade ao Mercosul.
"É o melhor exemplo de um
país indo para trás. A Venezuela não apenas está numa posição muito baixa no ranking como piora a cada ano."
A seguir trechos de entrevista feita por telefone, em que o
professor compara as vantagens competitivas do Brasil às
dos Estados Unidos e afirma
ainda que, se a China não fizer
reformas, verá suas fontes de
competitividade se "evaporarem automaticamente".
(MARIA CRISTINA FRIAS)
FOLHA - O país avançou em alguns
aspectos macroeconômicos e subiu
no "rating" das agências de risco.
Como o senhor avalia o resultado do
Brasil no ranking, em que ele regrediu algumas posições, ainda que o
número de países tenha aumentado?
XAVIER SALA-I-MARTIN - A leitura
desse resultado é que o Brasil
não tem mudado nos rankings.
Mesmo considerando a metodologia usada no ano passado, a
pontuação do Brasil, que era a
66ª, seria a 68ª. Estatisticamente, dada a possibilidade de
erro de mensuração, é o mesmo
número do ano passado [4,03
em 2006 e 3,99 em 2007]. Eu
diria que pela pontuação o Brasil piorou, mas, essencialmente, ficou na mesma. Quão bom
ou ruim se é no ranking não depende do estágio de desenvolvimento, mas das pontuações
dadas nos vários subitens. As
áreas de instituições públicas e
de macroeconomia são as piores para o Brasil. A estabilidade
macroeconômica brasileira
melhorou dramaticamente,
mas ainda há questões como
inflação, juros. Se o Brasil melhorou dramaticamente nos últimos anos, ainda tem um substancial "spread" nos juros, gastos do governo ineficientes, o
fardo da tributação, a dívida
pública, apesar de estar caindo.
O país não pontua bem no pilar
de ambiente institucional, em
direitos de propriedade, proteção intelectual, diversidade de
fundos públicos, confiança pública em políticos, ineficiência
em gastos do governo, tributação etc. Mas, por outro lado, o
país pontua bem em sofisticação empresarial e inovação.
FOLHA - Como explicar que o Brasil
tem melhor desempenho nesses indicadores tidos como mais avançados do que nos básicos?
SALA-I-MARTIN - É um fenômeno
surpreendente, mas o Brasil
não é o único. Outros países
não vão bem nos fatores básicos, nos ambientes institucional e macroeconômico, e vão
muito bem em fatores mais sofisticados como inovação e sofisticação empresarial, como os
Estados Unidos, que tem os
mesmos pontos fortes do Brasil. Há uma área econômica no
Brasil que está integrada à rede
mundial econômica, tem de
competir com os melhores do
mundo, desenvolveu sofisticação e é forçada pela globalização a inovar para sobreviver.
Por outro lado há uma outra
economia no país que parece
andar para trás: há regulação
excessiva, falta de confiança
nos políticos, desperdício de recursos públicos. É um fardo para muitas firmas que não operam na arena internacional, ficam menos competitivas.
FOLHA - A entrada da Venezuela
tornaria o Mercosul mais competitivo?
SALA-I-MARTIN - Acho que o tornaria menos competitivo. O
Mercosul deve, supostamente,
promover o mercado livre entre os membros, e a Venezuela
está se movendo exatamente
na direção oposta. É o melhor
exemplo de um país indo para
trás. A Venezuela não apenas
está numa posição muito baixa
no ranking como também piora
a cada ano: há menos mercado
livre, mais intervenção do governo, menos orientação pró-negócios, mais orientação política. Acho que não é uma boa
maneira de melhorar a competitividade. É claro que a Venezuela não foi um grande desastre econômico porque os preços do petróleo estiveram altos.
Eles conseguiram se mover na
direção errada sem, realmente,
perceber os resultados. Quando os preços do petróleo caírem
de novo, não se sabe se a economia venezuelana vai resistir.
FOLHA - Os graves problemas na
área macroeconômica dos EUA podem afetar sua competitividade no
longo prazo? E qual o cenário para
China?
SALA-I-MARTIN - Os EUA são
muito fortes por causa dos fatores sofisticados, estão no topo
do mundo em inovação, têm as
melhores universidades, têm
uma bastante forte colaboração
entre universidades e "business", um mercado de trabalho
muito flexível, um mercado de
bens muito competitivo, um
bom mercado financeiro que
possibilita inovação. Mas estão
andando para trás nos fatores
mais básicos: instituições públicas parecem estar se deteriorando, a área de negócios parece não confiar muito na administração Bush, no mínimo menos do que no ano passado, e a
estabilidade macroeconômica,
é bem sabido, está se deteriorando. A China em muitas maneiras é exatamente o oposto: a
fonte básica de competitividade da China vem da muito forte
estabilidade macro, em que está em 7º no ranking, e, claro, do
enorme tamanho do mercado,
que é uma fonte importante de
competitividade. Se a China
não fosse grande, as pessoas
não estariam se preocupando
com ela. Claro, tem problemas
grandes no ambiente institucional, corrupção, excessiva interferência do setor público na
economia privada. No médio
para o longo prazo, depende se
farão as reformas. A China esteve competindo com muito
sucesso, explorando seus salários muito baixos, o que não pode se sustentar por muito tempo. Os salários vão subir e as
fontes de competitividade vão
evaporar automaticamente.
Quando eles tentarem fazer
coisas mais sofisticadas, vão ter
de melhorar o sistema educacional, ter "business" mais sofisticados, vão ter de começar a
inovar, com mais flexibilidade
no mercado todo. A menos que
eles introduzam reformas, os
crescimentos vão parar. E não
será fácil porque o governo interfere muito na economia.
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