São Paulo, sábado, 01 de dezembro de 2007

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MOREIRA FRANCO

Programas sociais e a alta do cimento

É inegável que a subida exagerada de preço do cimento é fruto de uma especulação perversa

POR QUE o preço do cimento aumenta rápida e até abusivamente nas principais cidades do país? Só vejo duas razões: a ganância do cartel de sua produção e a ação ainda meio contemporizadora dos órgãos competentes. Hoje, o cenário de estabilidade monetária é comprovado pelos indicadores de preços das diversas instituições. O IPCA (IBGE), por exemplo, mostra a tendência declinante da inflação: a variação de preços, de 7,60% em 2004, caiu para 5,69% em 2005 e para 3,14% em 2006. Até setembro de 2007, acumulou 2,99%.
Diante disso, é inegável que a subida exagerada de preço do cimento é fruto de uma especulação perversa a que não se pode assistir passivamente. Com a alta, o cimento vai comprometer seriamente importantes ações sociais contidas no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), relacionadas ao setor da construção civil, o mais afetado pela manobra.
A indústria do cimento não é um exemplo de empresa que se move segundo as leis de um mercado perfeito. Esse é altamente competitivo e os agentes econômicos não têm muito espaço para alterações de preço, já que o mesmo produto estará disponível em outras empresas, por um preço igual ou inferior. No mercado perfeito, a receita da empresa cresce se ela vende mais.
Já no mercado imperfeito, os agentes aumentam o lucro com alterações no preço do produto vendido, na quantidade vendida ou em ambas as variáveis.
No caso do cimento, a alta decorre de um mercado que vê na retomada do crescimento da economia a chance para refazer suas margens de ganho. Em vez de elevar seus índices de produção, optou pelo caminho do lucro fácil.
Para resolver o gargalo entre os níveis de oferta do produto, a construção civil tem a opção de importar, facilitada pela apreciação do real ante o dólar. E por que o nosso interesse e preocupação com o preço do cimento? Porque a instabilidade do produto no mercado -alta ou negociação no câmbio negro e, o que é pior, risco de desabastecimento- cria uma situação de insegurança no setor da construção. As construtoras não estão tendo como planejar adequadamente o prazo e o custo da produção. A única saída, por sinal desastrosa, pode ser o aumento do preço do bem final, oferecido à população.
Em última instância, a alta de preços tem um efeito perverso, pois pesa na camada mais pobre da sociedade. E ela é o alvo das aplicações do FGTS.
Um desarranjo no setor não interessa ao governo, à Caixa ou ao FGTS. O fundo vem aumentando o ritmo de injeção de recursos no mercado. Em 2006, foram R$ 8,4 bilhões, com R$ 7,6 bilhões destinados ao setor habitacional. Até setembro de 2007, foram R$ 5,7 bilhões, sendo R$ 5,1 bilhões para a habitação.
A lei do FGTS determina que 60% de suas aplicações vão para a habitação -famílias com renda bruta de até R$ 3.900 ou R$ 4.900, em algumas regiões. Recentemente o Conselho Curador do Fundo destinou R$ 1 bilhão para o financiamento da casa própria para famílias com renda superior a R$ 4.900, desde que o titular seja cotista do fundo.
O cimento impulsiona os segmentos de saneamento e infra-estrutura. Ele não pode ser substituído na construção de habitações, pontes, viadutos e hidrelétricas. As construtoras garantem que o cimento representa, isoladamente, 5% do custo total de uma obra residencial, chegando a 15% nas edificações com padrão normal de acabamento.
Assim, insisto em que não se pode continuar a assistir, sem reação, à escalada do cartel do cimento. Afinal, não há razão para o Brasil permanecer refém dos que não querem a elevação do padrão de vida de seu povo.


WELLINGTON MOREIRA FRANCO 63, doutor em sociologia, ex-governador do Rio de Janeiro, é vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa.


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