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ARTIGO
Quem movimenta as alavancas do poder?
CÉLIO DE CASTRO
Mesmo sabendo estar na contramão de um certo determinismo, segundo o qual as questões
econômicas, por si sós, têm uma
dinâmica que as sustenta, lembro
que as políticas econômicas são
conduzidas por agentes. E esses
agentes são sujeitos, são pessoas. E
são elas que comandam as alavancas da política econômica do país.
Mais quem são os atuais agentes
da economia brasileira? São confiáveis? Quais suas origens?
Por mais espantoso que possa
parecer, as alavancas estão nas
mãos de velhos intelectuais de esquerda, ou de banqueiros da atualidade, como queiram. Muitos deles, identificados no passado recente como professores universitários, economistas ou sociólogos.
Eram líderes da esquerda nos anos
80 e até na atual década. Em pouco tempo, se transformaram em
banqueiros nacionais e internacionais, assumindo as rédeas da
nossa economia.
Vi em detalhes esse processo de
mutação do ângulo privilegiado
de deputado federal constituinte,
do qual pude assistir também a
outro fenômeno: o empresário
brasileiro se envolveu tanto com as
regras atuais do mercado a ponto
de privatizar até a sua própria
existência.
Houve uma primeira fase da
Constituinte em que uma aliança
das esquerdas com o chamado
"centro da Constituinte" tentou
avançar e produzir um texto constitucional que fosse uma expressão
sincera das demandas nacionais.
Isso foi por água abaixo com o rolo
compressor da reação conservadora, denominada "Centrão".
Brasília fervia em debates. Enquanto isso, em São Paulo, intelectuais se reuniam e liam com a força de suas convicções "O Capital",
de Marx.
Não foi preciso muito tempo para que um segmento dissidente
desses intelectuais viesse confundir as coisas, passando a combater
as idéias que eles próprios defendiam em reuniões em centros de
estudos, como as que ocorriam no
então famoso Cebrap. Começavam, dessa forma, a dar a base
conceitual, ideológica, para a defesa do regime militar, o mesmo que
nos havia cassado, retomando o
que chamo de "a banda podre" do
governo militar, dando a ela uma
característica de modernidade.
No Rio de Janeiro, no apagar das
luzes do trabalho constituinte, a
cena era semelhante; economistas,
professores e outros profissionais,
entre uma privatização e outra,
entre uma assessoria na própria
Constituinte e algum outro negócio, buscavam o grupo de São Paulo e se aliavam às grandes finanças
internacionais. Foi por esse caminho que intelectuais aguerridos se
transformaram em nada menos
que banqueiros bem-sucedidos.
A segunda constatação: o grande
empresário brasileiro privatizou
até a sua própria existência. Aliás,
privatização é a palavra de ordem.
Nem cabe questionamento se é
correto privatizar ou não. Só a pergunta já ofende. O que é compreensível. Afinal de contas, no
que o megaempresário, hoje, pode
pensar, a não ser na privatização?
O grande executivo paulista, por
exemplo, sai de manhã protegido
por seguranças. Sua empresa está
num desses edifícios chamados
"inteligentes", que dispensam ascensoristas e outros profissionais
de apoio. Chega a seu escritório e
mergulha em seus equipamentos
eletrônicos. O almoço é em restaurante privê.
Exemplo de executivo bem-sucedido, ele não tem contato com a
realidade brasileira. Privatizou
sua própria existência como forma
de vida. Quando termina o trabalho, vai ao encontro de pessoas que
vivem as mesmas experiências e
que também não têm nenhuma
noção das necessidades do povo
brasileiro.
Conclusão: as alavancas do poder, hoje, estão nas mãos de duas
figuras emblemáticas. É claro que
faço uso de raciocínio paradigmático, uma metáfora que traduz, no
entanto, muito da nossa realidade. De um lado, intelectuais que se
transformaram em banqueiros. De
outro, o executivo que hoje nada
mais é do que aquele homem que
tem como resposta existencial a
privatização até dos seus hábitos.
Como se vê, a efervescência da
Constituinte abriu, de fato, espaço
apropriado para a definição das
regras do jogo da atualidade.
Célio de Castro, 66, médico, é prefeito de Belo
Horizonte (PSB) e coordenador-geral da Frente
Nacional de Prefeitos.
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