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Solavancos do dólar mostram que país segue mais vulnerável do que a maioria dos emergentes
Ameaça de guerra enfraquece mais o real
GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O dólar acabou fechando o mês
em queda, mas o abalo provocado
pelos temores de um ataque dos
Estados Unidos ao Iraque mostra
que o Brasil segue mais vulnerável
às turbulências do cenário internacional do que a maioria dos
países emergentes.
Numa comparação com as
moedas das principais economias
latino-americanas, o real foi a que
sofreu os maiores abalos a partir
do último dia 17, quando se intensificaram nos mercados os efeitos
da iminência da guerra.
No período, o dólar acumulou
alta de 3,61% no México e aumento de 2,25% no Chile. Na Argentina, houve queda de 1,53%, por
causa da conclusão de um acordo
com o FMI (Fundo Monetário Internacional). No Brasil, a elevação
foi de 7,05%, considerando as taxas médias diárias apuradas pelo
Banco Central.
Instabilidade
Mais do que a diferença de taxas, o comportamento da cotação
do dólar no mercado doméstico
mostra uma instabilidade muito
maior que nos países vizinhos
(ver gráfico).
As moedas mexicana e chilena
sofreram uma desvalorização
contínua e mais suave, enquanto
o real passou por solavancos diários, com altas e quedas intensas.
O fenômeno é ainda mais evidente ao se observar o câmbio do
início do ano até o dia 16, quando
a cotação do dólar despencou
6,78% e levou analistas a falarem
numa "lua-de-mel" entre o governo Luiz Inácio Lula da Silva e os
investidores.
A menos que se acredite na hipótese de o mercado brasileiro ter
um apego anormal ao pacifismo,
outras explicações devem ser buscadas para a transformação repentina da lua-de-mel numa crise
conjugal. "O mercado deu o benefício da dúvida ao governo, e tinha de dar mesmo, mas Lula ainda tem de entregar", diz Luiz Fernando Lopes, economista-chefe
do JP Morgan, referindo-se às
promessas de reforma da Previdência e autonomia do Banco
Central.
Leia-se: os credores do país gostaram muito, mais até do que esperavam, dos primeiros atos e declarações da equipe de Lula, mas,
de todos os motivos que levaram
à crise financeira do ano passado,
o único a ser eliminado foi a incerteza quanto ao resultado das eleições.
E, mesmo convencidos das boas
-sob a perspectiva deles, pelo
menos- intenções do novo governo, os investidores ainda duvidam das condições do governo
petista para promover as reformas que ficaram pelo caminho
durante os anos de Fernando
Henrique Cardoso.
O consultor Emílio Garófalo,
ex-diretor do BC, aponta uma razão técnica. No final de 2002, muito dinheiro foi enviado para fora
do país, e o retorno desse capital
valorizou o real na primeira quinzena de janeiro.
Quando o temor de guerra trouxe de volta a insegurança, continua Garófalo, os investidores buscaram refúgios mais seguros. "No
Brasil, qualquer mudança de investimento, para fundos estrangeiros ou outras moedas, passa
pelo dólar. Por isso, o dólar cai no
mundo e sobe no Brasil."
As explicações levam a uma
conclusão curiosa: a valorização
inicial do real foi movida por capital de curto prazo, especulativo,
o mesmo que o PT sempre condenou pelo seu poder de desestabilizar economias.
"Num momento de mudança
de expectativa, o primeiro capital
que sai ou aparece é o de curto
prazo", confirma Lopes, que também relativiza as comemorações
em torno das captações de recursos no exterior por empresas brasileiras em janeiro.
Repeteco
Como a maior parte delas foi
realizada por bancos, é provável
que se trate simplesmente de uma
estratégia para tomar dinheiro
mais barato no mercado externo e
emprestá-lo a juros altos no Brasil
-o mesmíssimo mecanismo que
levou à escalada do endividamento nos anos FHC.
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