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OPINIÃO ECONÔMICA
Empregos não caem do céu!
BENJAMIN STEINBRUCH
"Outsourcing" é uma
palavra que tem aparecido muito nas revistas internacionais, quando se referem hoje à
economia dos Estados Unidos.
Ela quer dizer "terceirização", encarna a principal preocupação
atual dos americanos em matéria
econômica e já virou tema central
na campanha para a Casa Branca. Significa a transferência de
empregos para o exterior, um movimento que ajuda as empresas a
cortar custos, mas reduz a oferta
de trabalho dos americanos.
O movimento decorre da natural procura de mão-de-obra barata e não-especializada, fartamente disponível nos países mais
pobres. A diferença é que, pela
primeira vez, o problema atinge a
elite dos colarinhos-brancos americanos, profissionais altamente
qualificados e pós-graduados.
Médicos especializados, advogados, analistas financeiros e principalmente engenheiros da área de
tecnologia da informação estão
perdendo empregos para concorrentes de países emergentes. Esses
profissionais estrangeiros não
precisam desembarcar nos EUA,
até porque a imigração não permitiria. Trabalham em seus próprios países, contratados por
companhias americanas, usando
os modernos meios de comunicação.
Estima-se que, só no setor de
software, os EUA já tenham perdido cerca de 500 mil empregos
altamente remunerados nos últimos anos por conta da terceirização de postos de trabalho, a
maior parte para a Índia.
Esse volume ainda não é muito
representativo para a economia
americana, que oferece 130 milhões de postos de trabalho. Mas,
mesmo assim, provoca uma enorme gritaria no país. Em Filadélfia, por exemplo, deputados propuseram uma lei específica para
punir empresas que praticam a
terceirização. As que contratarem
mais de cem empregados no exterior poderão ser obrigadas a notificar o Estado. Além disso, poderão perder o direito de prestar serviços ao governo e de receber garantias ou qualquer tipo de empréstimo oficial.
Durante o Carnaval, ao ler essas histórias de resistência americana, fiquei a imaginar como nós,
brasileiros, temos falhado na tarefa de desenhar um país mais
confortável para os próprios brasileiros. Há muitos anos não se vê
nenhum movimento obstinado
por medidas que estimulem o
crescimento econômico, os investimentos produtivos e a criação e
a manutenção de empregos.
A manutenção da taxa de juros
em 16,5% em janeiro e fevereiro,
contra todas as expectativas do
mercado financeiro, por exemplo,
foi uma gritante demonstração
de insensibilidade do Banco Central e, por extensão, do próprio
governo. Quase ninguém concordou que essa decisão, escorada
em expectativas pessimistas demais para a inflação e em análises exageradamente otimistas sobre a recuperação da atividade
econômica dos últimos meses.
Depois de 14 meses de governo
Lula, infelizmente, nada se avançou em matéria de criação de empregos. Números do IBGE mostram que o desemprego continuou aumentando e chegou a
11,7% em janeiro. Quando Lula
assumiu, em janeiro do ano passado, a taxa era de 11,2%. Ficou
fácil entender por que isso aconteceu depois que o próprio IBGE divulgou dados que mostram uma
dura realidade: o país viveu uma
recessão em 2003, o pior desempenho da economia desde 1992. A
queda do PIB foi de 0,2%, e a renda per capita sofreu redução de
1,5%.
O crescimento da economia
normalmente possibilita a criação de empregos, mas isso não é
automático. Nos Estados Unidos,
por exemplo, houve perda de 2,2
milhões de empregos desde a posse de George W. Bush, em 2001,
apesar da recuperação econômica, que já dura dois anos. O "outsourcing" e os ganhos de produtividade explicam em parte essa
tendência.
Empregos em quantidade, portanto, não surgem naturalmente
nem mesmo quando a economia
está em crescimento. É preciso ter
vontade política e tomar medidas
específicas voltadas para esse objetivo. Além de destruir os laços
familiares e a auto-estima do brasileiro, o desemprego estrutural,
como temos hoje, mina o consumo e onera o próprio governo, em
razão do aumento de demandas
assistenciais.
Acabou o Carnaval, a crise política foi atenuada e é hora de priorizar seriamente o crescimento e o
emprego.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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